A um passo de assumir o principal cargo da República pela circunstância de ser o vice do segundo presidente afastado em 24 anos, Michel Temer monta um novo governo com o desafio de enfrentar velhos problemas. Aos 75 anos, não tem tempo nem crédito político para cometer erros de estreante. Sua principal missão será consertar os erros cometidos por um governo do qual o PMDB foi parceiro de primeira hora, embora se comporte como se tivesse passado os últimos 13 anos na oposição.
Temer vai assumir um país com as contas públicas em processo de deterioração e economia em frangalhos. Recuperar a confiança do mercado é a tarefa número 1 delegada ao trio Henrique Meirelles, José Serra e Romero Jucá. É o que o futuro chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, chama de “animar a economia”. Essa animação se dará por um processo de transferência de serviços para o setor privado, por meio de concessões e parcerias.
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As primeiras medidas, alinhavadas nos últimos dias no Palácio do Jaburu, devem ser anunciadas amanhã, como uma sinalização de prioridades. O compromisso de não ser candidato à reeleição em 2018, firmado nas negociações para a montagem da equipe, facilita a apresentação de propostas indigestas.
Apoiado pelas principais entidades de representação da agricultura, da indústria, do comércio e dos serviços, Temer começa com o aval do PIB brasileiro, mas terá de dar a contrapartida, propondo reformas impopulares, como a trabalhista e a previdenciária. Essas duas reformas serão foco de tensão com os sindicatos, que não querem ouvir falar, por exemplo, em idade mínima para a aposentadoria, fim da contribuição sindical obrigatória ou supressão de direitos consagrados na Consolidação das Leis do Trabalho.
O risco de uma onda de greves foi avaliado, mas os aliados do vice acreditam que, com a economia em recessão e o desemprego em alta, os trabalhadores pensarão duas vezes antes de paralisar as atividades em qualquer setor. Eventuais ações violentas de grupos como o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra serão combatidas com rigor, na certeza de que a maioria da população não aprova bloqueio de estradas e invasão de propriedades.
O vice-presidente sabe que enfrentará uma oposição duríssima do PT, que colará nele o carimbo da ilegitimidade, por chegar ao poder sem o respaldo das urnas. Para neutralizar o PT, conta com dois fatores: o desgaste do partido e a superioridade numérica. Na Câmara e no Senado, Temer terá maioria folgada para aprovar reformas emergenciais, mas terá de agir com rapidez, porque, diferentemente dos eleitos que se ancoram no voto de milhões de brasileiros, carece de capital político para queimar.
Foi para ter essa maioria que Temer frustrou a expectativa dos apoiadores que esperavam um ministério mais técnico, composto por homens e mulheres notáveis, e formou um primeiro escalão dominado por políticos do alto, do médio e do baixo cleros.