Depois de dois adiamentos, que chegaram a levantar preocupações a respeito de sua continuidade, o POA JAZZ FESTIVAL enfim teve sua terceira edição neste final de semana. E o evento saiu melhor do que a encomenda: mesmo com 50% a menos de verba do que em 2015, a produção manteve a qualidade das atrações e o engajamento dos espectadores – que definitivamente abraçaram o festival, comparecendo em peso nas três noites.
Entre sexta-feira e domingo, nove shows passaram pelo Centro de Eventos do BarraShoppingSul – palco já tradicional da função, o local transforma-se em um quase clube de jazz, aconchegante e com boa acústica, que inclui bar e loja de suvenires. Destaque ainda para a ótima POA Jazz Band, que animou o povo tocando jazz tradicional entre uma apresentação e outra.
Confira os pontos altos desta edição do festival:
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Os jovens leões
Representante de ponta da novíssima geração de jazzistas que vem renovando a cena local, a banda KULA JAZZ fez o show mais vibrante desta edição. Misturando admiração e orgulho, o público aplaudiu com entusiasmo a energética performance do jovem quinteto gaúcho, que interpretou músicas de autoria do flautista FRANCO SALVADORETTI. O final da apresentação lembrou o genial saxofonista JOHN COLTRANE (1926 – 1967) com dois temas: My Favorite Things e Impressions – com direito a mais solos vertiginosos da flauta e do sax tenor de RONALDO PEREIRA.
Os mestres
O POA Jazz Festival começou em altíssimo nível com os violonistas MARCO PEREIRA e PAULO BELLINATI. Referências do violão brasileiro com projeção internacional, os músicos tocaram temas próprios e do venerável Dilermando Reis (1916 – 1977), de quem ambos são discípulos. Os solistas são tão baitas que nem precisam de cordas para tocar violão – como demonstraram batucando seus instrumentos durante Jongo, clássica composição de Bellinati.
Os aviões do jazz
O MANI PADME TRIO fez o melhor show deste festival. O grupo formado pelos ases YANIEL MATOS (piano), SIDIEL VIEIRA (contrabaixo acústico) e RICARDO MOSCA (bateria) esbanjou técnica, sensibilidade e entrosamento executando músicas do disco Voo (2016), como El Vuelo, Cimarron e a sempre linda Cais, de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos. Amparado pela cozinha rítmica segura de Sidiel e Mosca, o cubano Yaniel conquistou a plateia com seus solos e improvisos virtuosísticos. Ô, psit, caiu com o charuto aqui: você já escutou algum pianista cubano ruim? Não existe, né?
O homenageado
Saxofonista da banda Jazz 6, o escritor LUIS FERNANDO VERISSIMO foi o jazzista celebrado nesta edição. Presente nas três noites do evento, LFV recebeu cumprimentos de muita gente, incluindo do empresário ODED GRAJEW (foto) –o principal idealizador do Fórum Social Mundial estava coincidentemente na Capital no mesmo dia em que o sobrinho Daniel Grajew iria se apresentar, e foi lá conferir o show do rapaz.
Los Hermanos
O clima foi camerístico no concerto dos argentinos ADRIÁN IAIES, pianista de estilo elegante e preciso, e RODRIGO AGUDELO, guitarrista dono de um fraseado fluente e cristalino. Além de temas da dupla – única atração internacional desta edição –, Iaies apresentou no piano uma inspirada versão do clássico tango El Día que Me Quieras. Destaque ainda para a bela Años de Soledad, de Astor Piazzolla (1921 – 1992), em adaptação para piano e guitarra.
Os quatro ases
O refinamento musical do grupo formado pelo pianista ANDRÉ MEHMARI, pelo contrabaixista RODOLFO STROETER e pelo baterista TUTTY MORENO fez a cama sonora perfeita para a cantora Mônica Salmaso estender sua envolvente voz de meio-soprano-quase-contralto. Antes da vocalista entrar em cena, o trio mostrou versões arrebatadoras dos clássicos Só Louco, Samba Novo e A Vizinha do Lado, em que se destacou a inventividade das variações criadas por Mehmari. A base do sofisticado show que fechou a primeira noite do POA Jazz Festival foi o excelente disco Nem 1 Aí (2008) – que o quarteto não apresentava ao vivo há quase uma década.
O cara
Ele teria uma carreira de sucesso em qualquer lugar do mundo em que quisesse se radicar. Para nossa sorte, JORGINHO DO TROMPETE nasceu em Porto Alegre e toca ainda por aqui. Fechando os trabalhos do festival em alto-astral no domingo, o talentosíssimo músico – que deu uma ovacionada canja na noite anterior no show do guitarrista Alegre Corrêa, mandando bem inclusive no pandeiro – apresentou composições próprias como Paraíso, tema que começa como fusion, passa pelo samba e desemboca na salsa. Acompanhado de um grupo que incluía o polivalente Luiz Mauro Filho – o pianista também participou no festival da banda do guitarrista Julio "Chumbinho" Herrlein –, Jorginho ainda apresentou uma versão muito pessoal do standard Take Five.
A revelação
O duo de piano e contrabaixo acústico MARCOS PAIVA & DANIEL GRAJEW foi a grata surpresa do festival. Mostrando o projeto Bailado,os jovens instrumentistas fizeram uma abordagem pós-modernado universo sonoro de compositores como Ernesto Nazareth (1863 – 1934) e Chiquinha Gonzaga (1847 – 1935), desconstruindo ritmos como o choro, o maxixe e o lundu em interpretações entremeadas de citações a pérolas históricas da música brasileira. Baita show de uma dupla de músicos para se ficar de olho – e de ouvido –, ok?