O jornalista Vitor Netto colabora com o colunista Rodrigo Lopes, titular deste espaço.
Há 15 anos, já nas primeiras horas de junho de 2009, brasileiros e franceses acompanhavam aflitos informações de um avião que havia "sumido". O voo Air France AF-447 saiu do Rio de Janeiro às 19h29min do dia 31 de maio de 2009 com destino a Paris, na França. Ao todo, 228 pessoas de diferentes nacionalidades estavam a bordo do voo, que caiu no Oceano Atlântico em 1º de junho de 2009. Entre eles, três gaúchos: Roberto, Vera e Letícia Chem.
Pais e filha estavam a caminho da Grécia. Roberto havia passado em um concurso para professor titular da faculdade de medicina da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), e o casal estava indo, junto com a filha, comemorar. Já na manhã do dia 1º de junho chegaram as primeiras informações.
— Eu estava indo para o hospital trabalhar e no carro e ouvi uma notícia na Rádio Gaúcha de que o avião tinha sumido. Nós sabíamos desse voo, conferimos os dados e depois voltamos para casa, suspendi todas as minhas atividades para ficar aguardando notícias — explica o filho do casal, cirurgião plástico Eduardo Chem, diretor do Banco de Pele Santa Casa de Porto Alegre.
As horas seguintes foram de acompanhar as informações que chegavam na imprensa e os contatos com as autoridades.
— Juntamos um grupo em casa com familiares e amigos e, a partir de então, um ou dois conhecidos faziam os contatos diretos. Recebemos ligações da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), da companhia, mas eu tinha um grupo de amigos, pessoas muito próximas, para nos dar um pouquinho de ajuda.
No dia 2 de junho foi confirmada pelo ministro da Defesa brasileiro da época, Nelson Jobim, a queda do avião. Os primeiros destroços foram localizados no terceiro dia e os primeiros corpos só no sexto.
— Esperança sempre temos até acharem alguma coisa. Eu me lembrava que um avião caiu nos Andes há 40 anos, ficou 30 dias sumido e encontraram sobreviventes. Um outro avião caiu na Floresta Amazônica, ficou uma semana desaparecido e encontraram sobreviventes. Então, por que esse não poderia pousar em algum lugar, em uma ilha, no mar, em algum lugar? Claro que existe a esperança — enfatiza Chem.
Os corpos de Roberto e Vera foram encontrados dois anos após o acidente. O mesmo período em que foi encontrada a caixa-preta da aeronave.
— Era tudo que queríamos. Poder fazer uma despedida. Agora, o sentimento é de lembrança das coisas boas e de todas as mensagens que se recebe nesse período.
Em abril de 2023, a Justiça francesa absolveu a Air France e a Airbus pelo acidente. A companhia aérea e a fabricante foram julgadas por homicídios culposos. O fato ocorreu após 14 anos depois da tragédia. O tribunal de Paris absolveu as duas empresas por considerar que, embora tenham cometido "falhas", não foi possível demonstrar "nenhuma relação de causalidade" segura com o acidente.
— A minha esposa me deu muita força na época do acidente porque ela falou muito especificamente: "Não adianta tu ter raiva do piloto que puxou o manche (side-stick) para cima ao invés de para baixo, do comandante que saiu da cabine segundos antes de uma tempestade começar, da companhia que não trocou os tubos de pitot, mesmo avisada dos possíveis problemas. Isso não vai trazer eles de volta. Tens que pensar no que eles foram, em tudo que eles fizeram aqui, nas boas lembranças que deixaram no tempo que conviveram conosco".
Explicação do acidente
A aeronave deveria ter pousado às 6h10min (horário de Brasília) no aeroporto Charles de Gaulle, em Paris, mas não chegou ao local. Durante a madrugada, já sobrevoando o oceano, aparelhos chamados sondas pitot, que ficam acoplados na parte externa do avião e medem a velocidade em relação ao ar, congelaram.
Os dados coletados pelos tubos enviam informações para os computadores de bordo. Com o desencontro das informações dos pilotos com a realidade externa da aeronave, um dos pilotos do voo manteve o nariz da aeronave voltado para o alto, procedimento conhecido como stol. Como resultado de diversos fatores, o Airbus se chocou contra o oceano, em uma área próxima ao arquipélago de São Pedro e São Paulo.