O jornalista Vitor Netto colabora com o colunista Rodrigo Lopes, titular deste espaço.
Nesta sexta-feira (28) é celebrado o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+. A data faz referência a uma rebelião em Stonewall Inn, ocorrida em 1969, quando os frequentadores do bar homoafetivo em Nova York decidiram enfrentar a violência policial.
A coluna conversou com o advogado e professor de Direito da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e presidente Grupo de Trabalho Memória e Verdade LGBT do Ministério de Direitos Humanos, Renan Quinalha, sobre o momento atual e as perspectivas do movimento no Brasil.
Como está a luta LGBTQIA+ no Brasil neste último ano? Algum avanço significativo?
Entendo que sim, houve avanços bastante significativos para a comunidade. O fato de termos um governo aberto a essa discussão, com uma Secretaria Nacional que foi instaurada logo no início do governo, tem permitido uma articulação de políticas públicas importantes como de casas de acolhimento, que já foi um programa lançado nacionalmente pela secretaria. Também foi criado o Grupo de Trabalho de Reparação Histórica à População, que presido junto ao Ministério de Direitos Humanos, que faz a reconstrução da história e registro das violências contra a população desde a colonização até hoje e recomendação de políticas públicas para reparar essas violências. É inédito no mundo todo. É a primeira vez que um Estado nacional cria um grupo de trabalho para olhar para a história perante o direito à memória, verdade e a reparação histórica para a população LGBTQIA+. O tema tem crescido no debate público e temos visto mudanças importantes, apesar de o STF (Supremo Tribunal Federal) ter retrocedido algumas discussões, como não ter enfrentado nesse último mês a questão uso do banheiro para pessoas trans de acordo com a identidade de gênero. Entendo que o STF, pela posição política, está receoso de comprar determinadas brigas, porque o tema está mais visível e causa mais polêmica na opinião pública. Ponto para ficar alerta: essa articulação de uma extrema direita no Brasil e fora daqui de ataques aos direitos LGBTQIA+.
Quais pautas são mais prioritárias no momento?
A questão primordial sempre foi, sempre tem sido e é constante na história das pessoas LGBTQIA+ é a violência. O Brasil ainda tem índices muito dramáticos, que precisam ser levados em conta nas políticas públicas. Isso é a principal medida ainda, infelizmente. É um tema que a gente estaciona desde os anos 1970, no começo do movimento organizado, e que segue sendo prioritado. Já temos a criminalização da LGBTfobia, mas ainda há uma fragilidade de produção de dados estatísticos e, sobretudo, de organização de cursos e treinamento para agentes públicos que lidam com esses acolhimentos e denúncias. Essa questão ainda segue sendo primordial e acho que a principal bandeira agora tem sido a ocupação de espaços legislativos por pré-candidaturas da LGBTQIA+. Essa é uma prioridade nesse momento, foi o tema da parada LGBT desse ano, "Basta de retrocessos no Legislativo", porque a população LGBTQIA+, não tem tido uma guarida por parte desse Poder, como encontra muitas vezes no Executivo, a depender do governo, e no Judiciário. O Legislativo também deve desenvolver legislações protetivas tanto de combate à violência quanto de promoção de direitos, de cidadania de modo mais amplo. Isso tem sido uma bandeira prioritária de ocupar esses espaços, garantir mais representatividade, mais diversidade nos espaços de poder para a produção de leis e políticas públicas que contemplem as necessidades atuais da população que não vive só de direitos civis, depende de outras esferas de direitos também assegurados, como saúde, educação, trabalho, renda, assistência social, moradia entre outras.
Em ano eleitoral, o que o eleitor deve ficar atento?
As eleições vão ser muito marcadas por desinformação e por um viés moralista, como já outras foram, sobretudo a de 2018, mas também antes dela. As questões morais vem tomando o centro da agenda, e os setores conservadores enxergam aí uma maneira de ganhar capital político, atacando a cidadania das pessoas LGBTQIA+. Não só eles estão impedindo avanços, como tentando promover ataques e retiradas dos poucos direitos, precários direitos que estão hoje assegurados por decisões do STF, diga-se de passagem, não por projetos de lei aprovados pelo Congresso. O eleitor tem de ficar muito atento a essas campanhas de desinformação. Pautas LGBTQIA+ não são uma questão moral, não é ideologia política, é uma questão de direitos humanos e de direitos fundamentais. Por isso, é impositiva. É preciso votar nas candidaturas que de fato tem um compromisso com essa agenda, com essa construção de pautas que a mobilização do movimento tem trazido para a esfera pública para que consigamos acumular mais forças, ocupar mais espaços desses latidos e promover uma cidadania efetiva para esse segmento da população.