Desde que a Minustah, a força de paz das Nações Unidas para o Haiti, deixou o país caribenho, em 2017, aquele naco de território, metade da Isla Hispaniola, nunca mais teve paz.
Na verdade, desde antes da retirada do efetivo que durante 13 anos foi comandado pelo Brasil, havia um dilema internacional: sair e deixar a população à mercê de um Estado que ainda engatinhava enquanto instituição ou continuar despejando bilhões de dólares por ano lá, sob pena de eternizar a dependência de ajuda externa.
O mundo decidiu pela primeira opção. Abandonou o Haiti.
Hoje, quando se olha para o drama do país, onde as gangues voltaram a tornar o dia a dia da população um inferno, a sensação é de que muito do trabalho construído pelos capacetes azuis, um grande número oriundo de unidades militares do Rio Grande do Sul, foi jogado fora. O Haiti regressou várias casas no tabuleiro.
Diante do recrudescimento da violência, o Conselho de Segurança das Nações Unidoas aprovou uma resolução determinando o envio de forças policiais internacionais por um período de pelo menos um ano. Mas esse efetivo será composto por grupamentos sem grande experiência internacional - será liderado pelo Quênia, com ajuda de Antígua e Barbuda, Bahamas e Jamaica.
Nos bastidores de Brasília, é intensa a troca de mensagens entre os ministérios da Defesa, Fazenda, Planejamento e Relações Exteriores, que se dividem entre os defensores do engajamento de tropas brasileiras e aqueles que preferem deixar tudo como está. Entre as Forças Armadas, há vontade de voltar a participar de uma missão - os militares se dizem prontos. O problema é que, segundo a resolução aprovada na ONU, o atual mandato estabelece uma missão diferente da Minustah. Ela é composta apenas por policiais e não militares das Forças Armadas.
Na avaliação de um diplomata, enviar PMs para o Haiti poderia expor o o governo federal no nível doméstico, uma vez que a violência urbana vem crescendo em vários Estados por aqui. Outro ponto: para embarcar seus homens e mulheres, o Brasil não quer ir sozinho - gostaria de contar com o apoio das grandes potências, algo que, na avaliação de estrategistas, não há. Os Estados Unidos, por exemplo, estão envolvidos em duas grandes frentes de combate: o apoio à Ucrânia, via Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) no conflito com a Rússia, e a Israel, na guerra contra o grupo terrorista Hamas. A essa altura, o pobre Haiti está longe de ser prioridade, algo que certamente mudaria se China ou Rússia, potências extra-regionais e rivais dos americanos, decidissem olhar para aquele pedaço de terra a apenas 1,3 mil quilômetros da Flórida.