Cessar-fogo significa exatamente o que essa palavra diz: é quando as armas se calam por alguns dias, quatro no caso da trégua entre Israel e Hamas. Não significa o fim da guerra.
O acordo acertado com mediação dos EUA e do Catar envolve dilemas morais para Israel, que precisou negociar com terroristas no momento em que as feridas do 7 de outubro estão abertas. Talvez nunca fechem. Mas neste momento tudo ainda é muito sensível. A cada dia, os israelenses conhecem um ou outro detalhe a mais do festim diabólico daquele massacre. Quase todo cidadão israelense tem um familiar ou amigo morto naquele sábado - ou conhece alguém que o tenha. As memórias estão vivas, e elas remetem, para os judeus, ao Holocausto. Não é simples, para uma sociedade traumatizada, negociar com os autores daquele horror - assassinos, estupradores e sádicos.
Mas esta é a decisão correta, talvez a única forma de salvar reféns um mês e meio depois do início da guerra. Bombas que reduziram o norte da Faixa de Gaza a escombros e a operação terrestre não conseguiram este resultado.
Benjamin Netanyahu, a quem boa parte dos israelenses culpa pelo apagão de inteligência que facilitou o ataque, é também alvo de pressão por parte das organizações de familiares dos reféns, que marcham quase diariamente a Jerusalém, onde fica a sede do governo.
Embora acertado, o acordo, indiscutivelmente, fortalece o Hamas, uma vez que dá fôlego ao grupo e permite que seus homens se reagrupem. O preço a ser pagado poderá ser alto.
É conhecida a característica de Israel de não deixar nenhum de seus cidadãos para trás. Em 2011, o militar Gilad Shalit, feito refém em 2006, foi trocado por mil prisioneiros palestinos. Um dos presos soltos era Yahya Sinwar, que ao voltar para Gaza, se tornaria líder político do Hamas e um dos mentores do massacre do dia 7. Agora, o cálculo é 1 refém para três prisioneiros palestinos.
Por enquanto, estamos ainda no momento mais delicado: qualquer passo mal dado pode resultar em quebra de confiança de um ou outro lado - e, por consequência, pode haver a suspensão do acordo. Mas, ao final dos quatro dias de trégua, Israel terá de pensar nos próximos lances desse jogo de xadrez dramático: porque 186 pessoas ainda estarão em poder do Hamas. E há ainda a suspeita de que muitas estejam mortas.
Como trégua não é paz, a guerra vai continuar. Netanyahu prometeu seguir com os ataques. O Hamas fez o mesmo.