Nas relações internacionais, quando dois presidentes sentam para conversar é porque tudo que tinha de ser discutido já o foi. O paralelo, em parte, pode ser aplicado ao projeto da nova regra fiscal apresentado nesta quinta-feira (30) pelos ministros Fernando Haddad, da Fazenda, e Simone Tebet, do Planejamento. Digo "em parte" porque, o projeto que seguirá para o Congresso na próxima semana entrará um, e o que sairá de lá pode ser outro. Até porque se uma das definições do dicionário para a palavra "arcabouço" é "esqueleto", podemos dizer que conhecemos até agora apenas o arcabouço do arcabouço.
Mas o paralelismo com a reunião entre presidentes, onde tudo já está acordado antes do encontro, vale sobretudo para valorizar o que, desse processo todo de discussões sobre a nova regra fiscal, o mais acertado do ponto de vista político foi a costura que Haddad e Tebet fizeram. O objetivo foi justamente garantir "apoio" informal no Congresso para garantir que a matéria já chegue minimamente acordada nas duas Casas.
Percebe-se um trânsito sereno. E isso ocorreu porque os dois xerifes da nova regra fiscal fecharam o circuito: levaram a ideia da equipe econômica a Lula, que pediu ajustes. Voltaram à prancheta e em poucos dias retornaram com as devolutivas. Com o sinal verde do chefe, foram aos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que convocaram os líderes. Feito isso, chamaram os jornalistas e expuseram o plano à opinião pública.
Ao final do dia, a avaliação de muitos parlamentares era de que a proposta é consistente. Aos senadores, Haddad disse que seria muito difícil um projeto que agradasse ao mesmo tempo Gleisi Hoffmann, presidente do PT, e Roberto Campos Neto, do Banco Ventral. A fala ilustra, mais ou menos, o mesmo equilíbrio distante entre o cumprimento das promessas de gastos sociais da campanha eleitoral e as cobranças por austeridade da Faria Lima.
Até nesse aparente conflito de concepções, houve política. Lula chamou Gleisi para a reunião final no Alvorada, na quarta-feira (29). E, não sejamos ingênuos, Haddad e Campos Neto se comunicam. O presidente do BC inclusive disse na quinta-feira (30) que ainda não havia lido o projeto, mas tascou um elogio tímido de que houve "boa vontade muito grande em fazer um marco robusto".