A começar pela posse, em 6 de setembro, dia em que apareceu na última foto pública de Elizabeth II. Na imagem, a monarca, que morreria dois dias depois (8), no Palácio de Balmoral, na Escócia, Truss apertava a mão da rainha, que estava de pé, sorridente, apoiada em uma bengala. A política seguia a tradição de séculos, em que a presidente do partido com maioria no parlamento britânico, recebe o aval da chefe de Estado para formar o governo.
A cena talvez tenha sido o último momento de tranquilidade de Truss. Veio a morte de Elizabeth, uma monarca histórica. Com o país atordoado pela notícia, a primeira-ministra tomou, no mesmo dia, decisões duras contra a crise energética, anunciando o congelamento de preços por dois anos, e um auxílio para empresas, escolas e hospitais.
Antes mesmo disso, a própria política, secretária de Estado do turbulento governo Boris Jonhson, vencera uma batalha eleitoral fratricida no seio do Partido Conservador.
Mas aí veio a morte de Elizabeth, que, direta ou indiretamente, afetou o dia a dia do país. Diretamente porque Truss participou de muitas das cerimônias fúnebres, que duraram 11 dias, até o sepultamento, em 19 de setembro. Indiretamente, porque o país praticamente parou.
Com Elizabeth II enterrada, o rei Charles III posto, o peso da realidade caiu sobre os ombros de Truss. Seu governo anunciou cortes históricos de impostos e aumento de empréstimos, que derrubaram os mercados e os títulos do governo. A valorosa libra, moeda do Reino Unido, caiu para o menor patamar em 37 anos em relação ao dólar. O Banco da Inglaterra teve de fazer uma intervenção de emergência para salvar fundos de pensão.
Some-se a isso a dureza dos impactos do mundo pós-pandemia e de uma guerra na Europa, a da Ucrânia. Sob críticas, inclusive do Fundo Monetário Internacional (FMI), Truss defendeu sua agenda para o crescimento e reitera a promessa de não cortar gastos públicos. A inflação, que já fez governos naufragarem, como na Itália e no próprio Reino Unido, de Johnson, leva cidadãos às ruas. Membros do próprio Partido Conservador pedem que ela volte atrás.
Nas últimas duas semanas, ela tentou um ajuste - demitiu o ministro das Finanças, Kwasi Kwarteng, no dia 14 e pediu desculpas pelos erros, desistindo dos cortes de impostos. Mas o país já havia atingido um ponto de não retorno. Nesta semana, perdeu o segundo peso pesado do gabinete, a secretária do Interior, Suella Braverman.
Renuncia nesta quinta-feira (20), após 45 dias no cargo, o período mais curto na trajetória do Reino Unido. Teve guerra, teve morte da rainha mais longeva da História, o país tem um novo rei, mergulhou em caos econômico e a libra caiu a patamares recordes. Como eu disse no início deste texto, houve quase de tudo no mandato de Liz Truss, a breve.