Não é só no Brasil que o formato dos debates eleitorais está em discussão.
Nos Estados Unidos, a mais tradicional democracia do planeta, essa tradição é questionada por uma parcela do espectro político. Em abril, o Comitê Nacional Republicano decidiu sair da Comission on Presidential Debates, comissão que, desde 1988, organiza os duelos presenciais na TV e no rádio. A legenda, hoje na oposição, entende que o órgão bipartidário estaria favorecendo excessivamente os democratas.
Essa é uma amostra de dois fenômenos importantes dos tempos atuais. O primeiro: o quanto o trumpismo, facção política de Donald Trump, domina o pensamento da cúpula republicana. A acusação de que a comissão seria parcial repete as críticas feitas durante a campanha em 2020 pelo então presidente e candidato à reeleição.
A segunda: o formato dos debates televisivos e radiofônicos, uma tradição consolidada pelos EUA desde o confronto entre Richard Nixon e John Kennedy, em 1960, precisa ser discutido, diante do impacto das redes sociais e da desinformação como tática de campanha. Como tornar os encontros esclarecedores, que façam a diferença em relação ao esgoto da internet?
Aquela, aliás, foi a primeira eleição em que os políticos se deram conta do poder da televisão: um Nixon suando, sem maquiagem e arrogante, como de costume, perdeu a batalha da imagem para um Kennedy energizado, carismático e conversando com a câmera com facilidade. O republicano perdeu não só o duelo como a Casa Branca.
Mas, se por um lado, a comissão interpartidária que organiza os debates agora é questionada, ao menos, por mais de 30 anos ela conseguiu prestar algum serviço: estabeleceu ordem e regramentos aos debates.
Por exemplo, a cada eleição, são, em geral, três encontros em locais "neutros", como universidades, em pool - todas as emissoras que quiserem têm possibilidade de transmitir o evento, que é apresentado por jornalistas escolhidos em acordo.
Em 2020, o primeiro debate entre Joe Biden e Donald Trump foi na Crase Western Reserve, em Cleveland, Ohio. Sinal dos tempos, o evento foi caótico. Não por culpa da comissão, mas de Trump. Você deve lembrar: o candidato republicano simplesmente não deixou o oponente, Biden, falar. Não pela contundência de seus argumentos, mas pela falta de educação - ou, melhor dizendo, tática de retórica.
Nas semanas seguintes, a comissão revisou os regulamentos junto com os partidos. E o resultado, para os dois debates que viriam, foi uma série de mudanças, como o corte do microfone do candidato quando não fosse sua vez de falar. O fato de serem dois oponentes facilita.
Os EUA ditam o formato dos debates para o mundo. Um modelo que nasceu lá e que, depois, se espalhou é o "town hall", em que os postulantes são inquiridos por eleitores no estúdio, selecionados com supervisão de institutos de pesquisa para que representem uma amostragem próxima do real. O Brasil já adotou esse modelo, assim como a arena que permite aos candidatos caminharem pelo palco e não ficarem estanques atrás de púlpitos.
Há dois pontos aqui: ainda que Trump tenha tentado tumultuar os debates, não falou, em nenhum momento, em não ir - algo que os candidatos brasileiros aventam. Os americanos entendem a importância dos duelos. E, ainda que se questione o modelo, a maioria dos eleitores diz que os debates contribuem na escolha de seu voto. O público geralmente é constituído por aqueles que não se identificam automaticamente com nenhum dos dois grandes partidos no caso dos EUA. Os eventos contribuem, principalmente, para a decisão dos indecisos no país onde o voto não é obrigatório.