Desta vez, não será fácil para Emmanuel Macron. Não que em 2017 tenha sido um passeio. Mas a ascensão da extrema-direita na França acionava, em segundo turno, um botão que, automaticamente colocava em marcha uma "frente republicana" para barrar extremistas. Fora assim em 2002, quando Jean Marie Le Pen, pai de Marine Le Pen, beliscou a cadeira presidencial do Palácio do Eliseu, mas foi derrotado por Jacques Chirac. O mesmo botão de pânico fora acionado quando Marine passou ao segundo turno, quatro anos atrás, com Macron.
Não há garantias de que, agora, na repetição desse cenário eleitoral a "frente republicana", defensora dos princípios democráticos, se forme e muito menos que tenha o mesmo poder de barrar a candidata da extrema-direita. Por vários motivos. O primeiro deles é que a própria candidata Marine Le Pen tem apresentado um perfil mais moderado, tendo deixado o discurso xenófobo que sempre pronunciou para o outro candidato radical, Éric Zemmour, que, a se confirmarem as pesquisas de boca de urna, ficará em quarto lugar. Grande parte dos franceses já não veem Marine como uma ameaça à democracia. Segundo porque é governo e sofre o desgaste de cinco anos no cargo. Terceiro porque a esquerda tradicional detesta Macron, que, na presidência, adotou uma política liberal, como a reforma trabalhista, o fim do imposto sobre grandes fortunas, políticas de austeridade e redução de benefícios sociais.
Se o percentual de votação para Macron for, em 2022, maior do que no primeiro turno de 2017, quando obteve 24% (deve ser de entre 28% e 29%), é preciso não esquecer que Le Pen também ampliou o seu próprio desempenho. Cinco anos atrás, obteve 21%. Segundo pesquisa de boca de urna, deve conquistar agora entre 23% e 24%. Imaginando que os votos de Zemmour (que deve ter 7%) irão migrar automaticamente para Le Pen, ela alcançaria, no mínimo, 30%. Macron garante, em tese, os votos da direita tradicional, os Republicanos (Valérie Pécresse), que deve ficar com 5%, o que lhe faria subir, a pelo menos 33%, que pode ser considerado empate técnico com Le Pen.
Isso torna os 20,2% dos votos da esquerda radical, de Jean-Luc Mélechon (França Insubmissa), fundamentais para as aspirações tanto de Macron quanto de Le Pen. Some-se a fragilidade da frente republicana ao fato de um voto da extrema-esquerda não ser "natural" em Macron, um ex-banqueiro que, na visão desse setor, se preocupou, ao longo do mandato, muito mais em governar para Bruxelas do que para a França profunda, acende-se o alerta vermelho na campanha do partido Em Marcha!.
Menos de dois anos depois da derrota de Donald Trump nos Estados Unidos, talvez nunca a extrema-direita, representada por uma candidata anti-establishment, com discurso nacionalista e xenófobo, tenha estado tão perto do poder na França, um país que se orgulha de seus princípios democráticos. Também é importante destacar que, dos quatro primeiros candidatos à eleição, de um total de 12, três são extremistas, de um lado ou de outro do espectro político. E não esqueçamos que, assim como esquerda e direita (e seus extremos) se uniram contra Macron na crise dos Coletes Amarelos, quando da elevação do imposto sobre combustíveis, em 2018, eles podem voltar a abraçarem-se e formarem uma frente anti-Macron.
Então, o jogo está perdido para o presidente? Ainda não. Mas Macron precisa olhar para a preocupação central dos eleitores, o custo de vida. E deixar um pouco de lado, ao menos pelos próximos 14 dias, a ambição de se tornar uma nova Angela Merkel da Europa, para olhar as ansiedades do francês médio. E sobretudo manter-se no palanque, no qual subiu tardiamente no primeiro turno.