A cada eleição, a França tem exibido ao mundo, ao vivo, a falência gradual dos partidos políticos tradicionais. No primeiro turno, realizado no domingo (11), três dos quatro primeiros colocados, de um grupo de 12 postulantes ao Palácio do Eliseu, representam extremos do espectro político: Marine Le Pen, do Reunião Nacional (extrema-direita), que chega de novo ao segundo turno com 23,4% dos votos; Jean-Luc Mélechon (do França Insubmissa, extrema-esquerda), que alcançou 22%; e Éric Zemmour, do Reconquista (extrema-direita), que chegou a 7,1%.
O tradicional partido Os Republicanos (direita), de Valérie Pécresse e que já deu à França Jacques Chirac, obteve apenas 4,8% dos votos, ficando em quinto lugar. E pensar que, em 2017, o grupo chegou a 20%, quase indo ao segundo turno, mas tendo perdido para Le Pen.
Já a esquerda tradicional, o Partido Socialista (PS), representada este ano pela prefeita de Paris, Anne Hidalgo, teve um resultado ainda pior (1,8% dos votos). O PS, de outro nome histórico, François Mitterrand, era governo até cinco anos atrás, antes de Emmanuel Macron, com François Hollande. No pleito de 2017, alcançou 6,4% dos votos.
Os dois partidos que governaram a França, alternando-se no poder, desde 1980, não alcançaram juntos nem 7% dos votos.
A falência das forças históricas na 5ª República francesa é especialmente inquietante porque o país e a Europa vivem uma esquina preocupante da História, perda do poder aquisitivo, uma inflação que chegou a 5,1% em março, desemprego em alta (7,4% em 2021), uma discussão sobre a idade mínima para a aposentadoria, os reflexos da pandemia e com uma guerra a alguns quilômetros a leste de Paris.
Tudo isso não foi capaz de tirar muitos franceses de casa para votar - no país, o voto é facultativo. A abstenção chegou a 26% no primeiro turno, a segunda maior em 20 anos, inferior apenas a 2002, quando atingiu 28,4%. Em 2017, nas últimas eleições, havia sido de 22%.
O resultado pífio nas urnas e a elevada abstenção revelam a incapacidade dos partidos políticos tradicionais em responder às necessidades sociais dos franceses bem como um descrédito por parte dos eleitores. Sintomas que explicam a ascensão dos radicais (à esquerda e à direita).
Esse cenário se torna ainda mais preocupante uma vez que não há garantias de repetição da "frente republicana", a união de partidos moderados que costuma ser costurada, em nome da democracia, antifascismo e contra o nacionalismo exacerbado, para barrar os extremos. Um quarto dos eleitores da direita tradicional (Republicanos), por exemplo, disseram que votariam em Le Pen. Quase o mesmo percentual se repete em relação à esquerda radical (França Insubmissa), agora a terceira força política do país. Isso significa que não apenas a frente republicana pode não se formar como extrema-direita (Le Pen e Zemmour) e extrema-esquerda (ainda que informalmente) se unirem em uma frente "anti-Macron" e "anticapitalista".