Ainda vamos ouvir muito falar de Wuhan, a metrópole chinesa de 11 milhões de habitantes onde a covid-19 surgiu no final de 2019.
Primeiro porque até hoje não há explicações suficientes sobre a origem do coronavírus na cidade - por falta de transparência de autoridades locais, do comando de Pequim e devido à inabilidade da Organização Mundial da Saúde (OMS) em investigar a gênese da pandemia. Em segundo lugar, porque o novo surto em Wuhan é uma espécie de teste para as vacinas chinesas em geral diante da variante Delta. O país aplica apenas imunizantes produzidos na própria nação.
A China não fornece resultados sobre a eficácia das vacinas contra a nova cepa, com base em dados de testes clínicos de larga escala ou o uso empírico, nem divulga informações detalhadas de análises de laboratório. Isso dificulta qualquer análise independente.
Então, o jeito é confiar nas empresas. Liu Peicheng, porta-voz da Sinovac, fabricante da CoronaVac, disse à Reuters que resultados preliminares baseados em amostras de sangue de pessoas inoculadas mostraram redução de três vezes na neutralização do efeito contra a Delta. Ele informou que uma terceira dose pode apresentar ação mais duradoura e forte, mas não detalhou os dados.
As vacinas chinesas dominam as campanhas de imunização na América Latina. Por isso, olho em Wuhan, que começa a reviver o drama de mais uma onda.
Devido a sua falta de transparência habitual, o resultado da vacinação na China não aparece no site Our World in Data, amplamente utilizado como monitor independente do estado da imunização no mundo. Dados do governo dão conta de que em Wuhan 60% da população foi vacinada. Em Pequim, esse percentual chegaria a 80%.
Por enquanto, o número de casos ainda está na casa das centenas em todo o país, mas como 20 cidades já registram doentes de covid-19 (com variante Delta), o alerta está aceso, principalmente porque a cepa, que surgiu primeiro na Índia, é 60% mais transmissível. A maioria dos casos está em Nanquim, onde toda a população de 9 milhões de pessoas foi submetida a pelo menos três rodadas de testes de PCR. O mesmo deve ocorrer com toda Wuhan.
Há várias questões em jogo. A principal delas é a eficiência das vacinas chinesas contra a Delta. Entre os pacientes de Nanquim, a maioria havia sido imunizada, e a boa notícia é que os produtos parecem funcionar, uma vez que apenas 4% das pessoas infectadas, segundo o governo chinês, enfrentam quadros graves da doença. Tanto Sinopharm quanto Sinovac (como a CoronaVac é chamada lá fora) dizem que estudos com suas vacinas demonstram eficiência contra a Delta.
O outro ponto é político. Apesar da origem do coronavírus ter atingido em cheio a imagem da China, a resposta do governo, com contenção draconiana, praticamente fechando o país, obteve resultado satisfatório na primeira onda. A China registra, no total, 105 mil casos da doença e 4,8 mil mortos. Se a situação degringolar será muito difícil sustentar a narrativa do Partido Comunista Chinês de que a abordagem chinesa - pouco convencional - foi superior. Até porque, quando as cortinas baixarem nas Olimpíadas de Tóquio, o mundo voltará a olhar para a China que, dentro de seis meses, irá realizar (ou não) os Jogos de Inverno, em Pequim.