O Aeroporto Internacional Hamid Karzai da capital afegã, Cabul, foi palco nos últimos dias de cenas de desespero que já entraram para história dessa terceira década do século 21: famílias amontoadas à espera de um voo salvador, homens correndo ao lado de aviões prestes a decolar, pendurando-se ao trem de pouso.
Nas mais dramáticas cenas, um bebê sendo jogado por sobre o muro com arame farpado por pais, na tentativa de garantir o futuro do filho, corpos que despencam no céu de aeronaves ou mais de 600 pessoas em um cargueiro com capacidade para transportar no máximo cem.
Se você acompanhou essas imagens, deve ter se perguntado: para onde onde está indo quem tem a felicidade de conseguir entrar em um avião, deixando para trás os riscos da retomada do poder pela milícia Talibã?
As primeiras levas de refugiados foram transportadas para o Catar, no Golfo Pérsico. As famílias desembarcaram na base aérea de Al-Udeid, ao sul de Doha, a capital. Trata-se da maior unidade militar dos Estados Unidos no Oriente Médio, lar temporário de 13 mil militares americanos e sede do Comando Central dos EUA (Centcom).
Ironicamente, o porto seguro hoje de milhares de afegãos que fogem do Talibã foi também de onde partiu boa parte das aeronaves que atacaram o Afeganistão na guerra iniciada em 2001, após os atentados de 11 de Setembro. A base, cuja existência foi mantida sob segredo até as operações pós-ataques nos EUA, também foi fundamental para as missões no Iraque, em 2003, e contra o grupo terrorista Estado Islâmico no antigo país de Saddam Hussein e na Síria.
Embora enorme (abriga, além dos EUA, as forças aéreas do próprio Catar e do Reino Unido), o local ficou saturado rapidamente. Por isso, os Estados Unidos estão usando outras bases militares na Europa para receber, de forma temporária, os afegãos.
São em geral, unidades militares da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). De uma semana para cá, os refugiados estão sendo levados para essas bases na Espanha, Itália e Alemanha. Na Espanha, são utilizadas as unidades de Morón, em Sevilha, e Rota, em Cádiz. Na Alemanha, os afegãos estão desembarcando na base aérea de Ramstein, uma das maiores fora do continente americano.
No total, cerca de 15 mil refugiados devem chegar a esses três países. Mas não devem ficar por muito tempo. Na Alemanha, por exemplo, no máximo 10 dias. Os locais servem como uma espécie de ponto de triagem para averiguação de documentos (se houver), situação de saúde e laços com os americanos - ou, eventualmente, com o Talibã. Existe a preocupação entre as autoridades americanas de que eventuais extremistas possam se infiltrar entre os refugiados. Por isso, há triagem nessas bases antes de viajarem para os EUA.
O presidente Joe Biden prometeu que todos os afegãos que, de alguma forma, trabalharam para os americanos ou aliados durante os 20 anos de conflito no Afeganistão serão evacuados. Espera-se que sejam levados para os EUA ou realocados em nações aliadas.
O balanço mais recente dá conta de que cerca de 14 mil pessoas estão neste momento ainda no aeroporto de Cabul.
Bahrein, Colômbia e Kuwait prometeram receber os voos que saem de Cabul. Os Estados Unidos também recebem apoio de Canadá, Reino Unido e Austrália.
No total, cerca de 28 mil afegãos já foram retirados do país. Cerca de 5 a 9 mil pessoas por dia, no que Biden considerou uma das maiores operações de evacuação da história. A maioria sai em aviões C-17 Globemaster, gigantescas aeronaves de transporte de tropas. Mas também há voos fretados.