O sucesso do Chile e do Uruguai em suas campanhas de imunização contra a covid-19 atrai para esses países os olhares do mundo em busca de esclarecer a capacidade das vacinas em impedir novas infecções e mortes pelo coronavírus.
Como laboratórios vivos, essas duas nações latino-americanas têm apresentado um paradoxo que desafia a comunidade científica, infectologistas, indústria farmacêutica e gestores de saúde pública: por que, mesmo tendo as mais altas taxas de cobertura vacinal do mundo, a covid-19 segue avançando nesses países?
O Chile conseguiu a invejável marca de 47,11% da população vacinada com as duas doses e 60,89% imunizada com ao menos uma. O Uruguai tem 34,82% de seus cidadãos totalmente imunizados e 60,3% com pelo menos uma injeção.
Mesmo assim, o número de novas infecções tem aumentado nos dois territórios. No Chile, são em média 6 mil novos casos a cada 24 horas. Um surto atual, por exemplo, levou as autoridades chilenas a reativarem o lockdown no sábado (12) na região metropolitana de Santiago, diante de risco de superlotação de UTIs. No Uruguai, são 2,3 mil novos infectados por dia.
Esse paradoxo tem levado a questionamentos internos sobre a efetividade da CoronaVac, a vacina mais utilizada nesses dois países. No Chile, cerca de 80% das pessoas imunizadas até agora receberam o produto chinês no braço (o restante, 20% foi imunizado com Pfizer, Oxford e CanSino). Nesta terça-feira (15), o jornal El Mercurio traz uma reportagem na qual alguns especialistas defendem a necessidade de as autoridades adotarem produtos "mais efetivos" para frear os contágios. Segundo o Ministério da Saúde, entre 3 e 9 de junho, foram detectados 10.523 infectados com Sars-CoV-2 que haviam recebido duas doses de vacinas - sem distinção entre os produtos. Esse montante representa 27% do total de infectados nesse período.
É necessário cautela em relação aos questionamentos sobre a efetividade da CoronaVac nos dois países. No caso chileno, a hipótese mais provável, segundo cientistas, é de que ainda que a vacina chinesa não esteja impedindo novos contágios, ela está evitando mortes e quadros graves da doença. Nos últimos três meses, houve queda de óbitos em faixas etárias vacinadas totalmente (duas doses) - de 20,84% para quem tem mais de 90 anos, e de 4,35% entre 80 e 85 anos. Também caiu o número de pacientes hospitalizados e em UTIs por covid-19.
Não há unanimidade na comunidade científica sobre a efetividade da CoronaVac - há variações nos estudos por país. Os mais recentes, ainda em fase de análise pelos pares, demonstram graus de efetividades superiores ao que havia sido divulgado anteriormente.
No Uruguai, um estudo realizado pelo governo concluiu que a CoronaVac foi capaz de reduzir a mortalidade em 97%. No entanto, a pesquisa mostrou maior eficácia da vacina americana Pfizer para impedir os contágios e hospitalizações. O país tem usado a CoronaVac na população com menos de 70 anos e a Pfizer para aa pessoas com pelo menos essa idade.
É possível que a vacina chinesa seja capaz de reduzir internações e mortes, mas não consiga, sozinha, impedir completamente a propagação do vírus - o que sugere necessidade de vacinação combinada a outras práticas comportamentais. A maioria dos cientistas concorda que os novos surtos no Chile e no Uruguai estão associados a circulação de novas variantes do vírus e ao excesso de confiança na rapidez na vacina, o que levou a população ao maior relaxamento de medidas de proteção.