A história irá julgar se a estratégia da Suécia ao lidar com a pandemia foi a mais eficaz ou se contribuiu para mortes por covid-19 que poderiam ter sido evitadas. O método de evitar o confinamento virou tema de disputas ideológicas no Brasil e também provoca polêmica na Europa.
Não há certeza sobre acertos e equívocos até o momento. Mas, semana após semana, há sinais de reversão na estratégia, e o próprio mentor das medidas, o epidemiologista Anders Tegnell, admite que o governo "poderia ter feito melhor".
– Se encontrássemos a mesma doença, sabendo o que sabemos hoje, acho que a resposta seria um equilíbrio entre o que a Suécia fez e o que o resto do mundo fez – disse a uma rádio sueca.
Enquanto boa parte dos governos da Europa - e do mundo - adotou o lockdown entre março e maio, a Suécia decidiu apostar no bom senso de seus cidadãos. Bares, restaurantes, lojas e escolas - a economia de forma geral - permaneceram abertos, mesmo no auge da pandemia. Havia recomendação para que as pessoas mantivessem distanciamento social, mas não existiu nenhum tipo de coerção. Nem o uso de máscaras foi obrigatório durante toda a primeira onda.
A aposta, que teve amplo apoio da população, era de que a maioria dos casos de covid-19 provavelmente seria leve e que medidas de distanciamento social menos rigorosas eram mais fáceis de ser mantidas por um longo período - a ideia defendida por muitos médicos de que "precisamos conviver com o vírus".
O governo e seus epidemiologistas insistiram que, ao contrário do que diziam os críticos - entre eles, mais de 2 mil pesquisadores do próprio país -, essa não era uma experiência de "imunidade de rebanho", tão questionada em países como o Reino Unido, onde o primeiro-ministro Boris Johnson tentou implementá-la no início.
A primavera europeia foi dura - a Suécia registrou cinco vezes mais óbitos do que a Dinamarca e 10 vezes mais do que a Noruega, dois países vizinhos, embora com taxa de mortalidade inferior à das nações mais castigadas da Europa. Houve elogios até de alguns integrantes da direção da Organização Mundial da Saúde (OMS), como Michael Ryan. Tegnell e seu colega Johan Giesecke, formuladores da estratégia, se tornaram famosos mundo afora - e passaram a ser incensados por muitos economistas. Afinal, a economia sueca sofreu com a queda nas exportações, mas manteve-se aberta e funcionando. O PIB do país foi um dos que menos despencou no continente.
Mas a previsão de que a estratégia ajudaria a evitar uma segunda onda não está se confirmando. Segundo o Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC), a Suécia vem registrando média de 511,9 casos por cada 100 mil habitantes nas últimas semanas. As hospitalizações também subiram dramaticamente, com mais de mil pacientes com covid-19 em hospitais - aumento de 60% em relação à semana anterior.
A primeira medida de reversão da estratégia foi a proibição de venda de bebidas alcoólicas em bares e pubs depois das 22h, algo que limita, em tese, o convívio social. Nesta semana, o governo restringiu a oito o número de pessoas em reuniões públicas. Novas medidas podem ser impostas nos próximos dias, como a proibição de viagens.
Tegnell admite que a Suécia vive uma disseminação significativa do vírus em todo o país. E a Agência de Saúde Pública afirma que o alto número de casos no país na primeira onda não o protegeu suficientemente da segunda.