Com a Organização Mundial da Saúde (OMS) tendo declarado a crise de coronavírus uma pandemia, o que muda no combate à proliferação da doença?
O termo que significa uma epidemia com alcance planetário é mais simbólico do que um status de emergência dentro da entidade com sede em Genebra, na Suíça. E, por esse aspecto, a OMS vinha relutando em decretá-lo temendo gerar pânico em primeiro lugar e, em segundo, porque acreditava que o vírus ainda poderia ser contido com medidas como recrudescimento de fronteiras, fechamento de locais públicos, cancelamentos de aulas e outras ações do tipo.
Agora, a declaração de pandemia significa que não, essas medidas tomadas por governos não são suficientes. Indica que os países devem trabalhar não apenas para barrar um caso suspeito, isolá-lo, mas focar as ações em uma parcela da população mais ampla e vulnerável – crianças, idosos e pessoas com doenças crônicas. Ou seja, os Estados devem colocar em marcha estratégias sanitárias que possam evitar mortes.
O uso do termo não significa que a taxa de letalidade tenha sido aumentada em nível global. Mas que o risco de contágio é maior.
A OMS hesitava em decretar pandemia porque digladiava-se internamente entre a pressa e a demora. Na crise do H1N1, em 2009, a OMS foi acusada de ter exagerado na dose do alerta a serviço de interesses da indústria farmacêutica. O equilíbrio é delicado. Anos depois de ser acusada de ter provocado uma corrida às farmácias, unidades de saúde e acelerado desenvolvimento de vacinas para uma crise que, na avaliação de alguns especialistas, não era tão grave, a organização pecou pelo excesso de zelo. Só deu o alerta contra o ebola quando a doença já havia matado milhares de pessoas na África.
Como escrevi anteriormente, compreende-se a demora no caso do coronavírus. Mas, ao não declarar pandemia, a entidade deu margem para a propagação de fake news e o tratamento diferenciado entre nações no combate à doença. A transmissão recorrente do covid-19 estava ocorrendo em diferentes partes do mundo e de forma simultânea (um dos critérios para a pandemia) desde a semana passada. Em sete dias, o número de países com infectados mais do que dobrou.
A OMS é a única organização capaz de unificar ações globais contra o vírus e colocar lado a lado nações tão diferentes ideologicamente como o Irã (onde mais de 40 pessoas morreram ao ingerirem álcool com promessas de cura e um país sem acesso a medicamentos de última geração em razão de sanções econômicas) e os Estados Unidos (onde há amplo acesso à informação e vacinas estão sendo desenvolvidas), por exemplo. Compreende-se a relutância da OMS, mas o anúncio poderia ter sido antecipado a fim de unificar ações, protocolos e salvar vidas.