É ilusão pensar que Donald Trump polarizou o discurso político nos EUA. A América já estava rachada ao meio muito antes de o bilionário ganhar a eleição de um ano atrás — prova disso foi a campanha mais suja que os americanos protagonizaram em décadas. Outro testemunho dos tempos vindouros foi o resultado da disputa: Hillary ganhou, mas não levou.
Não se pode aplicar aqui o tapetão: na eleição de 2000, quando George W. Bush perdeu para Al Gore no voto popular, mas venceu na Justiça - a recontagem dos votos na Flórida deram ao republicano a Casa Branca. O resto da história é conhecida. Hillary, ao contrário, não entrou na Justiça, recolheu-se à derrota que foi justa. No complicado sistema eleitoral americano, vence não o mais votado pelo eleitor, mas o que conquista mais delegados no colégio de notáveis delegados. Goste-se ou não.
Sim, a polarização americana já existia antes de Trump. O que a pesquisa da Universidade de Maryland, publicada nesta segunda-feira pelo jornal The Washington Post, mostra é que a presença do bilionário como inquilino da Casa Branca só aprofundou esse abismo. Sete em cada 10 cidadãos consultados acreditam que existe uma divisão na sociedade americana como na época da Guerra do Vietnã, nos anos 1960. Outro dado: 70% dos entrevistados consideram que a administração Trump é disfuncional. Prova de que a culpa não é só dos republicanos: 80% dos americanos pensam que o Congresso (onde os democratas estão presentes com 194 deputados na Câmara e 46% no Senado) também é disfuncional.
Do lado democrata, o partido parece ter acordado de seu torpor pós-eleição. Viveu o luto, sentou no divã, talvez ainda não tenham saído dele, mas já dão sinais de vida. Hillary, por exemplo. Depois da derrota, ela se refugiou na mansão de Chappaqua, a 50 quilômetros de Nova York, passou os dias arrumando armários, passeando no bosque e bebendo taças de Chardonnay. Recompôs-se e começou a escrever What Happened (O que aconteceu), a sua versão sobre a derrota.
A necropsia da derrota é parte importante para voltar à luta - até porque os democratas não têm grandes nomes para 2020.
Trump, por seu lado, costumava chamar a política americana de "pântano de Washington". Nesse um ano desde a eleição de 8 de novembro, ele parece ter sido tragado para essa lama. Nesta segunda-feira, Paul Manafort, que chefiou parte da campanha de Donald Trump à Presidência no ano passado, foi indiciado e se entregou ao FBI , junto com Rick Gates, seu ex-parceiro comercial e que também participou da corrida presidencial. Os dois são acusados de 12 crimes: conspiração contra os EUA, lavagem de dinheiro, agenciamento, sem registro de interesses de outros países, duas acusações de falso testemunho e sete acusações relacionadas a contas e investimentos no exterior não desfradados. O caso faz parte da investigação do FBI sobre um possível complô entre membros da campanha de Trump e o governo da Rússia para favorecer o republicano e prejudicar Hillary. Enquanto isso, os republicanos adotam a posição de um ano atrás, usando o discurso de Trump contra ele próprio: é um outsider da política: "Não sei, não é comigo".
Começou a campanha para a eleição legislativa de 2018 — e a presidencial de 2020.