Na próxima quarta-feira, completa-se um mês desde o referendo em que os catalães votaram pela separação da Espanha. Embora ilegal, o processo foi um episódio simbólico. Desde então, os únicos atos de violência ocorreram naquele dia, com imagens de repressão policial por parte do governo central – cenas que provocaram escárnio mundo afora, fizeram trepidas os pilares da democracia espanhola e constrangeram a União Europeia.
A sucessão rápida de episódios das últimas horas desta sexta-feira lançam uma névoa sobre o futuro da Catalunha em particular e da Espanha como Estado moderno. Ao aprovar a resolução que, embora não seja a Declaração Unilateral de Independência (DUI, sigla que todos os espanhóis passaram a decorar nos últimos dias), está muito próxima de uma ruptura total com o governo central, o parlamento catalão, em Barcelona, deu largada a um processo político que será iniciado com a eleição de uma Assembleia Constituinte com missão de escrever a Constituição da República da Catalunha. Em resumo, não é a DUI, mas logo será.
Ato contínuo, menos de meia hora depois de aprovada a resolução em Barcelona, o Senado da Espanha, com sede em Madri, autorizou a aplicação do artigo 155 da Carta Magna espanhola (outra lei que os espanhóis passaram a decorar no último mês), que permite ao governo intervir em uma província rebelde – caso da Catalunha.
O artigo ataca a espinha dorsal da autonomia catalã, seus três eixos formadores: a destituição do governo do presidente Carles Puigdemont, a limitação dos poderes do parlamento local e a intervenção em todos os serviços essenciais, como a corporação policial Mossos d'Esquadra, uma instituição catalã, como o Barça e a cava.
A frase da presidente do parlamento catalão, Carme Forcadell, nesta sexta-feira é daquelas de entrar para os livros de História:
– Em virtude do que se acaba de expor, constituímos a república catalã, como Estado independente e soberano, de direito, democrático e social.
As duas medidas, de Madri e de Barcelona, aprofundam as incertezas sobre o futuro espanhol porque, de hoje em diante, não há mais possibilidade de diálogo – se é que houve em algum momento desde 1º de outubro. Tanto a Catalunha não irá voltar atrás em sua decisão de se separar da Espanha, quanto o governo de Mariano Rajoy não recuará até pôr fim ao separatismo – o que, em suas palavras, significa "a restauração da legalidade" e do "Estado democrático de Direito". Estamos diante do famoso ponto de não retorno.