Time é uma palavra que o mundo corporativo tomou emprestado do esporte. No caso do governo de Donald Trump o termo é ainda mais apropriado, tendo em vista o perfil dos homens e mulheres habituados aos jargões da administração privada que irão mandar nos Estados Unidos a partir de 20 de janeiro. O time de Trump obedece à lógica do chefe: governar o país como se fosse uma empresa. Muitos são bilionários como o presidente, com experiência em negócios. O fato de ter feito uma campanha alijada dos caciques republicanos permite a Trump certa autonomia na hora de escolher, sem precisar ceder às pressões do partido.
A maioria dos nomes do presidente nunca ocupou cargo público – aliás, nem Trump. Em geral, têm afinidade com as ideias radicais do chefe, como o secretário de Defesa, general James Mattis, chamado de “cachorro louco”, ou são favoráveis ao princípio de estado mínimo, como a escolhida para o Departamento de Educação, Betsy Devos. Riquíssima, Betsy foi presidente da Federação Americana para Crianças, grupo que defende suporte do governo a famílias para que seus filhos estudem em escolas privadas – por meio de instituições filantrópicas ou bolsas de estudo. Para os críticos, seria o início do fim do sistema de ensino público que tantos Nobéis deu aos EUA.
Ao contrário do que se poderia imaginar para um candidato eleito com 58% dos votos de cidadãos brancos, com discurso machista e xenófobo, sua equipe é eclética: há duas mulheres, além de Betsy, Nikki Haley, filha de pais indianos, indicada para o cargo de embaixadora americana na ONU, e Elaine Chao, nos Transportes; e o neurocirurgião negro Ben Carson, convidado para o Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano.
Trump mandou o Partido Republicano às favas durante a campanha, mas, agora, precisa dele para fazer aprovar seu principal nome, Rex Tillerson, CEO da Exxon Mobil, para o cargo de secretário de Estado. A função é tida como a mais importante do governo, porque representa a voz dos EUA em um mundo ainda ansioso por interpretar cada sinal emitido da Trump Tower. Dono de uma agenda de causar inveja a líderes mundiais, diplomatas e jornalistas, Tillerson é conhecido como “amigo” do presidente russo, Vladimir Putin. No caso, podemos dispensar até as aspas. Em 2013, ele recebeu a medalha “Ordem da Amizade”, do Kremlin, por serviços prestados para reaproximar russos e americanos. O momento da indicação para o cargo não foi dos melhores: dias antes do reforço nas suspeitas de interferência da Rússia na eleição americana. Os republicanos têm maioria no Senado, o que faria supor que a aprovação de Tillerson seria fácil. Não é: a base do partido não quer aproximação com a Rússia e pesos-pesados se manifestaram:
– Me preocupa a relação próxima que ele (Tillerson) tem com Putin – disse John McCain, ex-candidato republicano, que perdeu para Barack Obama em 2008.
– Ser amigo de Vladimir (Putin) não é atributo que eu deseje ver em um secretário de Estado – comentou Marco Rubio, senador pela Flórida, no Twitter.
Outra curiosidade é a escolha de três generais para a cúpula do governo, o que põe em risco a tradição de comando civil na defesa e na segurança interna. Militarmente, os EUA dividem o mundo em áreas de atuação – e dois oficiais que chefiaram o Comando Sul, responsável por operações na América Latina, e o Comando Central, na zona do Oriente Médio, estão no time. John Kelly, que perdeu um filho no Afeganistão, vai comandar a Segurança Interna. Nas palavras de Trump, “a pessoa indicada para realizar a urgente missão de frear a imigração ilegal”.
O general Michael Flynn foi nomeado assessor de Segurança Nacional, enquanto outro marine, general James Mattis, assumirá o todo-poderoso Departamento de Defesa. Uma de suas pérolas:
– A primeira vez que você estoura alguém não é um evento insignificante. Dito isso, existem alguns idiotas no mundo que precisam tomar um tiro.
Dois nomes ventilados após a vitória de Trump, em 8 de novembro, não ganharam até agora seu pedaço no bolo: o ex-governador de Massachusetts Mitt Romney, um dos melhores nomes do partido, que perdeu para Obama em 2012, chegou a ser cogitado como secretário de Estado. Não levou. Também surpreende a ausência do ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani, que abraçou Trump nos momentos mais solitários da campanha. Foi cotado como procurador-geral, secretário de Estado ou diretor da CIA. Mesmo se ficar sem cargo, deve ser eminência parda do regime.
Se Trump pretende dirigir o país como uma empresa, vale um alerta: antes de se tornar bilionário, ele próprio já levou suas companhias à falência. Não terá esse direito como CEO dos EUA.