Uma semana depois da revelação de que está sendo investigada pelo Ministério Público Federal (MPF) por venda de armamento que teria parado nas mãos de guerrilheiros no Iêmen, a empresa Taurus procurou ZH para fornecer detalhes da operação e afirmar que está certa de que tudo correu dentro da lei. Com sede no Rio Grande do Sul e controlada desde 2014 pela paulista CBC, a Taurus fechou em 2013 a venda de um lote de 8 mil armas para o governo do Djibuti, país africano próximo ao Iêmen.
A negociação foi intermediada pela empresa Itkan, representada por três executivos, um deles Fares Mohamed Mana'a, que, desde 2010, consta na lista da ONU como um dos maiores traficantes internacionais de armas.
O primeiro carregamento de pistolas e revólveres chegou ao Djibuti em 2014 e, segundo a investigação, teria sido desviado para o Iêmen. A Taurus afirma que a venda foi aprovada pelo Ministério da Defesa brasileiro e pelo Itamaraty e que o Djibuti não está sob embargo da ONU. Dois ex-executivos da Taurus foram denunciados pelo MPF por venda ilegal de armas. O processo está concentrado em Eduardo Pezzuol (ex-gerente de exportação) e Leonardo Sperry (ex-supervisor de exportação), que comandaram as negociações. "(Os executivos) se valeram de fraude para simular o destino real do armamento, bem como para ocultar o envolvimento do também denunciado Fares Mana'a, uma vez que se tratava de país sob embargo internacional e pessoa sancionada pelas Nações Unidas", aponta a denúncia, que está em segredo de Justiça e cujo teor foi divulgado com exclusividade na semana passada pela agência de notícias Reuters.
Num primeiro momento, a reportagem afirmou incorretamente que a Taurus também estava denunciada, mas, em seguida, a Reuters corrigiu a informação.
O segundo lote da venda, composto por 3 mil armas, deveria ter chegado ao Djibuti em 2015, mas foi interceptado pela Taurus quando já estava embarcado em um navio e desviado para a Arábia Saudita, onde está armazenado à espera do desfecho da investigação policial. No início de 2016, a empresa cancelou todos os negócios com o país. A venda de pistolas e revólveres para o Djibuti gerou uma receita de US$ 2 milhões, o equivalente a 0,5% do mercado anual da Taurus no exterior.
Por conta do negócio que está sob investigação, o Rio Grande do Sul recebeu por alguns dias, em 2015, a visita do traficante de armas Mana'a. Na condição de executivo, ele visitou a fábrica da Taurus em São Leopoldo e teve despesas de hospedagem pagas pela Taurus. A empresa afirma que, como é de praxe em casos de visitantes estrangeiros, procurou facilitar a entrada dele no Brasil junto ao Itamaraty.
A Taurus reconhece a sensibilidade de negociar armas com países da região conhecida como Chifre da África, envolvida em guerras e com presença de organizações terroristas, como a rede Al-Qaeda. Mesmo assim, não buscou, à época, informações detalhadas sobre o perfil dos clientes, especialmente Mana'a. Esse processo, segundo os executivos, foi revisto e maiores controles foram implantados.
Fares Mohammed Mana'a lidera rebeldes huthis na região de Sadah, no Iêmen. Mas seus negócios vão além das fronteiras do país _ suas armas, compradas no mercado ilegal, abastecem inclusive o grupo Al-Shabah, braço da rede terrorista Al-Qaeda na Somália.