Longe de mim agourar qualquer coisa, mas essa lei recém-sancionada pelo prefeito Sebastião Melo, que prevê enterrar toda a fiação da Capital em até 15 anos, não para em pé.
Claro que seria uma maravilha: imagine Porto Alegre que nem Gramado, sem um único risquinho cruzando o céu, sem falta de luz em qualquer vendaval, sem furto de fiação com tanta frequência. Todos adoraríamos. Mas enterrar o material custa uma fortuna, as concessionárias não são obrigadas a gastar com isso e, se gastarem, vão subir consideravelmente a conta de luz. No episódio mais recente do Perimetral Podcast, que apresento com o colega Léo Saballa Jr., ouvimos dois engenheiros que estudam o assunto. Nenhum deles se mostrou otimista.
Talvez até pudéssemos debater a fiação subterrânea em algumas regiões específicas, com investimentos possíveis de serem absorvidos, mas em toda a cidade? O potencial de frustrar a população é imenso – e Porto Alegre conhece bem esse tipo de roteiro. Do famigerado metrô ao aeromóvel da Zona Sul, promessas mirabolantes só servem para uma coisa: tirar o foco da discussão que precisa ser feita.
E a discussão central, neste caso, deveria ser como melhorar a gestão da infraestrutura atual. Basta olhar para cima, para aquele monte de maçaroca desordenada, para ver que essa gestão é um desastre. O espaço aéreo de Porto Alegre virou a casa da mãe joana: ao alugar os postes da CEEE, dezenas de empresas de telefonia, TV a cabo, internet e fibra ótica foram instalando novas fiações sem retirar as antigas. E nunca se fez algo realmente efetivo para frear essa bagunça.
Além de abandonar montanhas de lixo sobre as nossas cabeças, jamais divulgaram um plano para evitar apagões nas chuvaradas. Quais são as áreas de maior risco? Temos um mapeamento das árvores que precisam de poda? Que regiões deveriam ter cabos mais resistentes? Existe um levantamento dos postes comprometidos? Responder a essas questões é fazer uma boa gestão.
Se aceitarmos a rede subterrânea como única solução possível, estaremos aceitando a incompetência de um sistema que, podem acreditar, não vai desaparecer em 15 anos só por causa de um canetaço. E não custa lembrar que, na freeway e na Rodovia do Parque, a fiação subterrânea foi desenterrada e voltou a ser aérea, em 2019. Motivo: os furtos no subsolo também eram recorrentes – melhor, então, manter tudo lá no alto, onde a manutenção é mais barata.
Em resumo, não importa tanto se os fios passam por cima ou por baixo. O fundamental é cuidar deles direito.