David Coimbra foi um homem feliz. Não tenho qualquer receio de errar quando digo isso. David levava a vida como eu sempre quis levar: era o maior modelo que eu tinha sobre como conduzir a própria existência.
Quando entrei em Zero Hora para ser seu assistente, há 15 anos, pensei que nada me impressionaria mais do que a velocidade com que ele escrevia textos sofisticados, provocativos, deliciosamente saborosos e incrivelmente fáceis de ler. Afinal, eu era – e ainda sou – meio lento para produzir qualquer coisa. David sentava por 20 minutos em frente ao computador e paria uma obra-prima.
Mas o que me chamava mais a atenção, o que me instigava todos os dias, o que me fazia observá-lo, admirá-lo, examiná-lo com minúcia e, principalmente, o que me fazia tentar copiá-lo (quase sempre sem sucesso) era outra coisa: era a leveza. Como ele conseguia? O mundo podia estar caindo, o trabalho podia massacrá-lo, a sorte podia abandoná-lo, mas lá estava o pândego David tentando sorrir.
– O cara tem que se divertir – ele pregava.
Não que fosse um alienado, evidente que não: David refletia profundamente sobre as intempéries da vida, mas sempre enxergou nela, na vida, uma graça e um apanágio que pessoas como eu, por exemplo, frequentemente não conseguiam. Nunca fui um deprimido, é verdade, mas as angústias do cotidiano, o nervosismo, a ansiedade e o medo dominaram meus dias tantas vezes. David não deixava que isso ocorresse com ele:
– Qual é a graça de viver assim, PG?
Em resumo, era um homem que também sabia viver a tristeza: o segredo é deixá-la aparecer, tomar conta da gente, quando ela realmente merece estar presente. Mas a vida, no dia a dia, não tem por que ser triste. Nem no finalzinho, quando já se sentia fraco, David deixou de celebrar a existência. "Amo viver, amo a vida e sempre amarei. Mas não estava sendo recíproco", escreveu ele em uma de suas últimas crônicas.
A vida é boa, sim, David, obrigado por ter batido tanto nessa tecla. E obrigado por me mostrar como se faz para ser feliz.