Para justificar a demolição do Anfiteatro Pôr do Sol, a prefeitura de Porto Alegre alegou que a estrutura está condenada, que não há mais o que fazer, que a única solução é botá-la abaixo. Por favor, é muita desfaçatez.
A prefeitura abandonou de propósito o Anfiteatro Pôr do Sol. Tanto no governo atual quanto no anterior, eu mesmo procurei o poder público várias vezes cobrando uma atitude para salvar o palco à beira do Guaíba. Mas a resposta era sempre a mesma: não valia mais a pena gastar com manutenção, já que o objetivo era (e ainda é) conceder aquele trecho da Orla à iniciativa privada.
Quer dizer: a prefeitura negligenciou deliberadamente o anfiteatro. Deixou que ele se transformasse em uma pocilga, em um chiqueiro, em uma montanha de entulho, para agora poder dizer:
– Não há o que fazer, vamos ter que demolir.
Importante deixar claro que conceder aquela área à iniciativa privada, por si só, não é um problema: a ideia é que o futuro investidor construa no local uma moderna estrutura de eventos – que seguirá recebendo shows com entrada franca, mas também espetáculos com cobrança de ingresso –, além de uma marina pública e outros equipamentos no chamado trecho 2. Tudo bem, até aí.
A reflexão que precisa ser feita é outra: pode a prefeitura deixar por tanto tempo um bem público caindo aos pedaços sob a alegação de que, sabe-se lá quando, haverá um destino apropriado para ele? É razoável isso? É respeitoso com a cidade? É juridicamente defensável? A resposta é não para todas as perguntas. Porque a manutenção de bens públicos é responsabilidade intransferível do Executivo. É uma obrigação básica. Me admira, aliás, que o Ministério Público nunca tenha feito nada para contestar esse descaso calculado.
E o mais maluco é que, embora já tenha anunciado a demolição, o governo municipal nem sabe quando isso vai ocorrer. Porque, claro, demolir custa algum dinheiro, então essa missão ficará a cargo do futuro concessionário. Mas, como o edital de licitação ainda nem foi lançado, o investidor privado só deve assumir a área daqui a uns dois anos.
Ou seja, até lá, Porto Alegre seguirá convivendo com um monstrengo de lixo horrorizando a paisagem mais emblemática da cidade. Um monstrengo que a própria prefeitura criou.