Esse monumento acima deveria exibir a cabeça de Francisco Brochado da Rocha – primeiro-ministro do Brasil durante o breve parlamentarismo que antecedeu o golpe de 1964 –, mas a escultura foi decapitada 10 dias depois de sua restauração.
Aliás, todas as obras restauradas em 2016, no Parque da Redenção, foram destruídas em menos de duas semanas. Brochado da Rocha, Imperatriz Leopoldina, Alberto Bins, João Wesley, Luiz Englert e Francisco de Assis Brasil, se não ficaram sem cabeça, acabaram irreconhecíveis. Em 2014, outros seis monumentos da Redenção já tinham sido recuperados pelo mesmo projeto do Sinduscon – e nenhum deles durou um mês.
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– Não se tem notícia de outra cidade no mundo, em tempos de paz, que tenha perdido mais monumentos do que Porto Alegre. Nos últimos 17 anos, pelo menos um terço das nossas 300 obras sofreu perda total – calcula o professor do Atelier Livre José Francisco Alves, autor do livro A Escultura Pública de Porto Alegre.
José Francisco diz que essa devastação ganhou força na virada do milênio, quando, nas palavras dele, "houve uma quebra de qualidade no bem viver urbano do porto-alegrense":
– A qualidade do espaço público tornou-se um horror: as ruas são uma buraqueira, as praças são malcuidadas, a Ponte de Pedra foi abandonada, o Mercado Público segue em obras. E o que é o Viaduto Otávio Rocha? A depredação dos monumentos é só a ponta mais visível da relação entre a cidade e seu espaço público.
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Mas o historiador Gunter Axt aponta para a realidade distante da região central. Cita, por exemplo, os frequentes tiroteios na periferia e o toque de recolher imposto pelo tráfico:
– Uma pessoa que tem parte de sua cidadania sequestrada nunca se sentirá pertencendo ao espaço público. O resto da cidade não se preocupa com ela, a imprensa tampouco. Como é possível exigir que ela se preocupe com o resto?
É de ser perder a cabeça mesmo.