As duas estagiárias se entreolharam, apreensivas, e logo baixaram a cabeça para examinar o comprimento da saia e do vestido que usavam.
Aquele e-mail, enviado na semana passada a todos os servidores do Departamento Municipal de Habitação (Demhab), falava sobre as roupas que os funcionários "não devem utilizar". Tinha lá uma lista: vestidos colados ao corpo, bermudas e vestidos muito curtos, camisas/blusas com decotes prolongados, camisetas tipo regata, bermudas masculinas, calção, shorts, chinelos de dedo, bonés e camisas de futebol.
– Meu Deus, tá ali o diretor! – assustou-se uma funcionária de calça rasgada, embora calça rasgada nem estivesse entre as restrições, quando viu Amancio Ferreira na saída do elevador.
Amancio é o novo diretor adjunto do Demhab. A decisão de enviar o comunicado ocorreu após uma reunião comandada por ele, como o e-mail deixava claro. O fato de ser pastor evangélico adicionou pimenta à polêmica.
– Fiquei muito triste – disse Amancio à coluna. – Essa questão nada tem a ver com minha atividade religiosa, foi apenas uma orientação às chefias do departamento. Não houve imposição ou proibição.
De qualquer forma, o prefeito Nelson Marchezan decidiu intervir: suspendeu as orientações do diretor e classificou-as como "um equívoco". A secretária adjunta de Desenvolvimento Social, Denise Ries Russo, concordou que o tom da mensagem pareceu autoritário, mas, segundo sua assessoria de imprensa, gestões anteriores do Demhab também enviavam comunicados semelhantes.
– Na nossa gestão, não houve isso, não faz sentido – disse Marcos Botelho, diretor-adjunto do departamento entre 2013 e 2016.
– Enquanto estive lá, nunca teve determinação sobre as roupas – garantiu Humberto Goulart, diretor-geral do Demhab entre 2009 e 2012.
Ainda assim, já que muitos funcionários lidam com o público, a vestimenta é considerada importante pela direção atual. Denise e Amancio prometem repensar, no mínimo, a maneira de dizer isso à equipe.