Recue um século nas manchetes de jornal. Em junho de 1917, as notícias referiam-se à Batalha de Messines. Os ingleses cavaram túneis sob as trincheiras alemãs e as minaram. Em instantes, 10 mil alemães morreram. Dia 7 passado foi o centenário da explosão não atômica mais letal da História. Um dia ruim para a Alemanha.
Mas a I Guerra Mundial distribuía maus dias para todos. Na ofensiva do Somme, o exército britânico, em um só dia, 16 de junho do ano anterior, teve 57 mil baixas, dessas, 19 mil mortos. Acredita-se que as perdas totais, especialmente de franceses, na Batalha de Verdun foram de 976 mil mortos.
Essa guerra foi a primeira experiência de excelência em termos de mortes em massa. A tecnologia industrial chegara na lógica da guerra. Uma geração europeia inteira foi amputada. Qualquer foto de família era uma boca desdentada de seus mais novos. Foi um genocídio de jovens: milhões encontraram a morte antes de descobrir a vida e outra parte foi aleijada física e espiritualmente. Os que voltaram das trincheiras eram perturbadoramente silenciosos, não tinham palavras para descrever o horror que viveram.
Cada um de nós um dia descobre a dimensão mortífera da nossa espécie. Uma das tantas razões para as comuns depressões na adolescência é dar-se conta do lado sinistro da condição humana. Deixar a inocência infantil é uma dura tarefa. No meu caso, o desencanto com o mundo deu-se conhecendo essa guerra.
Um livro me capturou para o conflito: Nada de Novo no Front, de Erich Maria Remarque. O escritor conta sua experiência como soldado alemão. Ele conserva um olhar adolescente quando descreve a fria em que se meteu no sem-sentido daquela carnificina, em que jovens matavam uns aos outros por razões impalpáveis.
Foi isso que me engatou: um imberbe contando a outro, pois li na adolescência, que o mundo tem seus momentos de açougue e quem maneja a faca pode ser você.
A questão não é lutar, pois podem existir guerras inevitáveis, mas essa era apenas estúpida.
Sabe o filme Jogos Vorazes, na sua lógica de matar ou morrer? Era isso, apenas em escala planetária. Durante a Guerra do Vietnã, alguns psicanalistas arriscaram uma hipótese: os adultos, invejando a juventude, eram tomados por uma espécie de complexo de Cronos – aquele que devorava seus filhos – e por isso mandavam os jovens morrer na guerra. Tolice, as guerras não começam por humores familiares, mas é inevitável que assim pareça, pois ela realmente adora carne adolescente.
Pense com calma, quando foi que você descobriu o lado escuro da força? Qual fato matou um tanto de sua alma? Na adolescência os laços entre os pares são um antídoto: é entre si que os jovens reencontram a vontade de seguir vivendo e a crença em que o mundo possa outra vez ser solar.