Nestes tempos turbulentos, até o próximo dia 15 ainda é possível visitar a elogiada mostra Soulèvements, em cartaz no Museu Jeu de Paume, na capital francesa. A exposição, pensada e organizada pelo filósofo e historiador da arte francês Georges Didi-Huberman, reúne cerca de 250 obras antigas e contemporâneas em torno do gesto de insurreição, numa enciclopédia visual e emocional do ato de rebeldia através dos tempos. A mostra transdisciplinar revela representações artísticas e iconográficas de diferentes movimentos de contestações, de Goya às revoltas da atual era digital. O visitante cruzará em seu caminho com Nietzsche, Pasolini, Picasso, Victor Hugo, Courbet, Sigmar Polke, Annette Messager, Baudelaire, Chris Marker, Michel Foucault, Gilles Caron, Manet, Jean-Luc Godard, Man Ray, Miró, Rosa Luxemburgo, García Lorca ou os brasileiros Hélio Oiticica e Cildo Meireles, entre tantos outros. A esperança não é gigantesca, mas ela existe, diz Didi-Huberman:
– Eu quis mostrar imagens de esperança.
Cartas de um tempo perdido
"Caro amigo, há mais de três semanas lhe escrevi uma carta infinitamente longa e sobretudo tão importante para seus livros e para o meu. Não recebi uma palavra de sua parte, e me inquieta ver que você responde a tanta amizade com tão pouco. Marcel Proust." A queixa integra as cinco missivas inéditas e mais um telegrama enviados em 1920 pelo célebre escritor francês a Pierre de Polignac, duque de Valentinois, publicados agora em livro pela Gallimard. No final de julho de 1920, Proust escreve: "Você poderia jantar comigo esta noite (mas isso de nada serviria do ponto de vista do trabalho, é somente para o prazer)? Ritz, se desejar". Em outra carta, logo depois, diz: "Caro amigo, lamentei que você não estivesse livre. Pensei que ninguém seria digno de substituí-lo, e jantei só neste salão do Ritz...". A ruptura entre os dois amigos não tardou, e o duque acabou inspirando o maltratado conde de Nassau, na saga Em busca do tempo perdido. Antes de finda a amizade, em uma longa carta de 20 páginas, Proust aborda a escrita de sua obra maior: "Em vez de trabalhar, perdi mais de 25 anos em prazeres inúteis e doenças evitáveis (não venéreas!). E é somente agora, à beira do túmulo, incapaz de um curto bilhete, apenas com um instrumento falseado, um cérebro rebelde, que me lanço na tarefa que cada um tem o dever de concluir, e que é de deixar seu testamento e seu pensamento".
Tête-à-Tête
O casal de paulistanos Gustavo e Célia Mattos um dia decidiu mudar de vida e desembarcou em Paris para fazer um curso na prestigiada escola culinária Le Cordon Bleu. Hoje chefs de cozinha, recentemente condecorados pela Academia Culinária da França, são os criadores do Chez Nous, Chez Vous ("nossa casa, sua casa"), onde recebem clientes para jantares privados em seu apartamento, com vista para a Torre Eiffel.
A primeira vez em Paris?
Em 2005, um misto de excitação, medo e insegurança. São sentimentos normais quando se muda radicalmente de vida.
Paris manhã, tarde ou noite?
Por ser a Cidade Luz, sem ser um clichê, diremos noite!
Um lugar em Paris?
Aux Trois Mailletz (56, rue Galande, 75005).
Uma surpresa em Paris?
A rua Crémieux (75012), pelo colorido desta pequena e charmosa via, um pouco como o Caminito de Buenos Aires.
Uma decepção em Paris?
O Réveillon. Pensamos que seria uma verdadeira festa na rua, uma joie de vivre, mas é um clima triste.
Uma recordação em Paris?
Uma festa em homenagem a Paris que ocorreu no Le Bon Marché, em setembro passado, com a presença da grande Régine.
Um chef francês?
Arnaud Lallement (do restaurante L'Assiete Champenoise, em Tinqueux, próximo a Reims).
Uma refeição em Paris?
Frango assado com batata frita do restaurante L'Ami Louis! (32 Rue du Vertbois, 75003.)
Um vinho e um champanha?
Château Figeac e Krug Clos d'Ambonnay.
Uma receita preferida de vocês?
Tripas à la Mode de Caen, um clássico da gastronomia da Normandia, que adoramos degustar, mas também preparar.
Um prato para o final de ano em Paris?
Capão recheado com manteiga de trufas negras.
Uma palavra em francês?
Desolé.
No Brasil, do que sentem saudade de Paris, e vice-versa?
No Brasil, sentimos saudade da segurança e da liberdade de Paris. Em Paris, sentimos falta da família, dos amigos e dos gatos que ficam no Brasil.