O verão em que a França celebra os 70 anos da criação do biquíni ficará marcado por um outro traje de banho, que poderia ser definido como sua antítese. Neste final da temporada estival europeia, todas as atenções se voltaram para o burkini, vestuário de praia islâmico que deixa visível apenas o rosto, as mãos e os pés, e alvo de polêmica nos últimos dias por sua interdição decretada em várias praias francesas. O biquíni, como se sabe, fez sua primeira aparição na capital francesa em 5 de julho de 1946, na piscina Molitor, pelas mãos de Louis Réard – engenheiro mecânico que administrava a loja de lingeries de sua mãe –, e vestido pela dançarina Micheline Bernardini – conhecida por suas performances desnudas na casa de espetáculos Casino de Paris. Já a invenção do burkini é creditada à australiana de origem libanesa Aheda Zanetti, que conta ter parido a ideia em 2004, em Sydney, ao ver sua sobrinha sofrendo ao praticar esporte coberta por um longo véu hijab.
O burkini foi agora proibido por prefeitos de localidades francesas em "defesa da laicidade" e sob argumento de ameaça de "perturbação da ordem pública" por encarnar "um símbolo do extremismo islâmico" nestes tempos de atentados terroristas jihadistas, acendendo mais uma controvérsia no país. Para a ministra dos Direitos das Mulheres, Laurence Rossignol, o burkini não é "uma nova linha de maiôs" nem uma "nova fantasia", mas "uma versão praia da burka", com a mesma lógica de "encerrar, dissimular o corpo das mulheres para melhor controlá-las". Já o presidente de honra da Liga dos Direitos Humanos, Michel Tubiana, denunciou as proibições como uma "estigmatização" e uma ameaça às liberdades individuais, e defendeu que não cabe ao Estado ditar como as mulheres devem se vestir nas praias da República Francesa. O Conselho Contra a Islamofobia na França (CCIF) foi além do discurso e entrou com um recurso contra as interdições junto ao Conselho de Estado, a mais alta jurisdição administrativa francesa.
No passado, obviamente por outros motivos, o biquíni também sofreu ataques e foi proibido na Espanha franquista, na fervente católica Itália e ainda na Bélgica ou na Alemanha, onde sua liberação ocorreu somente nos anos 1970. Na própria França, o biquíni, após ter sido criticado pelo jornal do Vaticano, L'Osservatore Romano, foi banido em 1949 de certas praias da costa atlântica, para depois alcançar a consagração, em 1953, ao ser imortalizado pela musa Brigitte Bardot, então com apenas 18 anos, na praia do Hotel Carlton, em Cannes.
Aliás, a quem interessar, até o dia 30 deste mês, as sete décadas do biquíni estão sendo comemoradas em Paris pela Galeria Joseph (7, rue Foissart, 75003), com a exposição de 70 fotos inéditas ilustradas por nomes como Doris Day, Marilyn Monroe, Ava Gardner, Elizabeth Taylor, Jane Mansfield, Ursula Andress ou a já citada BB. Mas, em meio ao acalorado debate sobre o burkini neste epílogo do verão, os franceses já estão ansiosos pela chegada das primeiras brisas de outono.
Pódio da popularidade
A cada ano, os franceses elegem por meio de uma pesquisa de opinião, feita pelo instituto Ifop, suas 50 personalidades nacionais preferidas. No pódio deste ano, o ator Omar Sy aparece pela primeira vez no topo, destronando o músico Jean-Jacques Goldman, que caiu para o segundo posto após seis anos consecutivos na liderança. Em terceiro lugar, na mesma colocação do ano passado, surge Simone Veil, a ministra da Saúde responsável pela legalização do aborto no país, em 1975. A sondagem confirmou a baixa cotação dos políticos em atividade.
O primeiro da lista, o ex-presidente Nicolas Sarkozy, que ambiciona o retorno ao Palácio do Eliseu nas eleições de 2017, amarga a 48ª posição. Seu consolo é que seu principal rival, François Hollande, atual chefe da nação, nem figura na relação.
Street-art no museu
Paris terá em breve seu primeiro museu de street-art. A arte de rua urbana do grafite será acolhida em um espaço fechado, na École 42, no número 96 do bulevar Bessières (75.017), a partir de 1º de outubro. De acesso gratuito ao público, o local de 4 mil metros quadrados vai expor 150 obras de 50 diferentes artistas, entre eles reputados nomes como os de Banksy, Shepard Fairey, JR, Invader, Clet, Monkey Bird, Romain Froquet, Momo ou Futura 2000. Na origem do projeto Art 42 está o ex-diretor do espaço Pierre Cardin e especialista em arte urbana Nicolas Laugero Lasserre. A maioria dos trabalhos artísticos que estarão em exposição provém de sua coleção particular. Paris se antecipa a Berlim, considerada a capital europeia da street-art, que deverá ter também um museu para a arte de rua, mas só no ano que vem.
Victor Hugo à mão
Um dos maiores best-sellers da literatura francesa acaba de sair do forno em uma edição limitada de mil exemplares, em dois volumes, com um total de quase mil páginas. Trata-se do clássico Notre-Dame de Paris, de Victor Hugo (algumas vezes publicado no Brasil com o título de O corcunda de Notre-Dame). A novidade do livro lançado pela Editions des Saint-Pères é a reprodução do texto tal qual foi escrito à mão pelo renomado autor, a partir do original bem guardado na Biblioteca Nacional. Os curiosos poderão testemunhar a grafia e o work in progress manuscrito da mítica obra, com anotações à margem e rasuras feitas pelo autor, além das ilustrações de centenas de gravuras, algumas delas assinadas pelo próprio Victor Hugo. A aventura literária tem, obviamente, um custo: 249 euros pelos dois tomos.