Recupero texto antigo para, em homenagem às vítimas da monstruosidade ocorrida nos EUA, refletirmos sobre ela. Só assim, de alguma maneira, as mortes não terão ocorrido em vão. Conversemos em todos os níveis, das escolas aos estádios de futebol. É preciso mexer na cultura reacionária que insiste em fazer o que é próprio dos reacionários - reagir à evolução. Mas NÃO LAMENTO dizer a esses mistos de dinossauros e abutres: a evolução chegou para seguir adiante. Não adianta o esperneio das baratas. Escrevi dois livros ambientados no meu clube do coração, o Grêmio - "Coligay - Tricolor e de todas as cores" e "Somos azuis, pretos e brancos". São trabalhos que falam sobre pluralidade e respeito às diferenças, com belas e edificantes histórias na instituição onde cresci, sempre ao lado do meu pai, com seus valores evoluídos sobre diversidade. Na ocasião em que publiquei este artigo, eu havia escrito apenas o "Coligay". Por motivos que você entenderá a seguir, esse livro, de que tanto me orgulho, fez eu sentir, pela primeira vez na vida, a crueldade da homofobia.
Aqui, o artigo:
Não quero, leitor, que vejas este texto como um artigo. É conversa franca, tá? Falo de episódio que vivi em 2014 e da forma como me impactou naquele 12 de novembro, quarta-feira, chuvinha fina na Feira do Livro. Eu autografava Coligay – Tricolor e de todas as cores, que trata de diversidade. Pois foi minha mulher quem os flagrou. Dois sujeitos apontavam meu livro, gargalhavam e desfiavam piadinhas infames. Confesso que aquilo mexeu comigo. Não devia, mas mexeu. Passei o resto da semana, incluindo o domingo, remoendo a cena. Pensando: tem marmanjo que evita meu livro porque sente vergonha, como guri comprando absorvente pra mamãe na farmácia e temendo ser chamado de mulherzinha. Sei que é situação até corriqueira, por vezes acompanhada do infame "kkk" nas redes sociais. Mas, no ato, me pareceu tão, tão... abjeta! Depois, mais calmo, refletindo sobre o porquê de eu ter me abalado, dei-me conta: aos 50 anos, experimentei, por intermédio do livro que tanto me orgulha e ensina, a crueldade da homofobia. Claro, eu não tinha noção do peso de tamanha agressão, porque sou heterossexual padrão, dois filhos, coisa e tal. Mas é incompreensível esse troço de não aceitar diferenças quando temos, como traço marcante da condição humana, a diversidade de dons, cores, desejos e... fé.
Opa! Fé! Vamos falar em fé. Sou judeu, e a base da minha religião é crer em um só Deus, sem santos ou quaisquer imagens. Monoteísmo clássico. No mais, dizem os sábios que a Torá, o Pentateuco, pode ser interpretada de 70 formas diferentes, o que dá caráter plural ao judaísmo. Mas há algo como uma "cláusula pétrea": não faças ao outro o que não gostarias que fizessem a ti. E tu dirás: era Jesus quem dizia isso. Claro! De que fonte Jesus, um "rabi", bebeu para espalhar sua mensagem de amor? Ora, chegamos ao ponto. Seja qual for sua fé, reflita. O que importa quando falamos sobre preconceito não é a mensagem emitida, mas a maneira como o receptor se sente impactado. De minha parte, te conto: o antissemitismo torna seu portador, automaticamente, meu desafeto. Dói! Sobre a homofobia, descubro, aprendendo com meu livro: é cruel como qualquer outra intolerância e deveria ser banida da convivência humana pela simples razão de que trai a essência plural do humanismo.
Estamos conversados?