
Atração da Tela Quente desta segunda-feira (5), às 22h25min, na RBS TV, Cruella (2021) não é apenas mais uma refilmagem com atores ou em estilo realista de um desenho animado da Disney. Inédito na televisão aberta, trata-se também de mais um filme recente em que um personagem malvado ganha protagonismo, em que um vilão pode ser encarado como anti-herói, em que o revisionismo histórico é aplicado à ficção.
Um dos casos já clássicos é o do ciborgue assassino interpretado por Arnold Schwarzenegger em O Exterminador do Futuro (1984). Em O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final (1991), o T-800 virou mocinho.
Outro caso reluzente é o de Loki, no Universo Cinematográfico Marvel. Ele nasceu como um típico vilão shakespeariano, em Thor (2011), e tentou liderar uma invasão alienígena em Os Vingadores (2012). Mas a interpretação de Tom Hiddleston foi tão fascinante que o Deus da Trapaça logo conquistou uma legião de fãs. Como consequências, tornou-se capaz de gestos nobres e virou astro de uma série batizada com seu nome.
E não dá para deixar de citar Coringa (2019), no qual o notório psicopata, homicida em massa e arqui-inimigo do Batman ganhou uma história de origem bastante humanizadora, a ponto de, desde a primeira cena, sermos levados a nutrir empatia pelo futuro vilão, fruto envenenado pelo Estado e pela sociedade que o abandonaram.
Na Disney, a onda começou com Malévola (2014). No filme estrelado por Angelina Jolie, descobrimos que a bruxa de A Bela Adormecida só amaldiçoa a vida da princesa Aurora porque sofreu uma terrível traição na adolescência. Mais do que isso: na "verdade", era a própria Malévola, e não as três fadas, quem protegia a mocinha. Na continuação lançada em 2019, soubemos que nem cabe à vilã de mentirinha a culpa pelo sono profundo que acometeu o Reino dos Moors.

Antes de redimir Scar, em Mufasa: O Rei Leão (2024), o estúdio reinventou Cruella de Vil, a vilã surgida na animação 101 Dálmatas (1961). Não por acaso, a Disney escalou como diretor o australiano Craig Gillespie, que em Eu, Tonya (2017) mostrara a versão da patinadora Tonya Harding (vivida por Margot Robbie) para um dos maiores escândalos do esporte olímpico: o caso de agressão a Nancy Kerrigan, sua rival na equipe dos EUA para os Jogos de Inverno de 1994.
Cruella é protagonizado por Emma Stone, ganhadora do Oscar de melhor atriz por La la Land (2016) e por Pobres Criaturas (2023). Ambientado na Londres dos anos 1970 e embalado por uma trilha onipresente que inclui Rolling Stones (com a lugar-comum Sympathy for the Devil), Queen, David Bowie, Supertramp, The Clash e Deep Purple, o filme é pré-101 Dálmatas, ou seja, foca na transformação da jovem estilista Estella na fashionista nefasta Cruella.

A personagem, como escreveu meu colega William Mansque, é uma das piores vilãs da Disney: "É ela quem almejava matar 99 filhotes de dálmatas só para produzir um casaco de pele". Agora, uma cena trágica "justifica" seu ódio. E Cruella vira uma anti-heroína, já que encara gente muito pior: a Baronesa, papel de Emma Thompson.
Em meio a essa discutível reinvenção de índole, o filme tem atrativos inegáveis. Vale destacar a atuação de Paul Walter Hauser como Horácio, um dos ajudantes da aspirante a vilã (o outro é Gaspar, encarnado por Joel Fry). E saltam aos olhos, a cada cena, os figurinos bolados por Jenny Beavan, vencedora do Oscar por Uma Janela para o Amor (1985), Mad Max: Estrada da Fúria (2015) e pelo próprio Cruella, que também concorreu ao prêmio da Academia de Hollywood na categoria de maquiagem e cabelos.
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