Inflação, recessão, desemprego, desequilíbrio fiscal. Demolição da lei de responsabilidade fiscal, aniquilação da credibilidade do regime de metas de inflação brasileiro, segmentação alarmante do mercado de crédito devido à atuação abusiva dos bancos públicos. A Petrobras reduzida a pó, a Caixa Econômica Federal enfrentando problemas que, possivelmente, deverão exigir que seus rombos sejam cobertos pelo governo. Estados e municípios estrangulados por dívidas que tencionam renegociar com a União, esforço que alimentará a alta incessante da dívida pública brasileira. Será que esqueci de incluir algo nessa lista, lista de amarguras que Temer, o futuro timoneiro brasileiro, terá de encarar nos primeiros dez segundos de seu eventual governo?
Reformas, reformas, reformas, eis o mantra da suposta "volta à normalidade". Sim, reformas. Mas, quais reformas? Há consenso - palavra rara entre os economistas - de que os problemas do Brasil são de natureza fiscal, que a prioridade do timoneiro tem de ser iniciar o conserto das contas públicas sem o qual o crescimento e o emprego não serão restabelecidos. Até aí, canja de galinha. O problema é saber por onde começar quando se desconhece o tamanho do rombo. E se o governo tiver de dar alívio aos Estados que já não conseguem pagar o funcionalismo público, ou fornecer serviços essenciais como segurança? E se o governo tiver de injetar dinheiro na Petrobras, como vários economistas têm ressaltado nos últimos dias? E se o governo for obrigado a recapitalizar a Caixa, dilapidada pelos desvarios daquela que se preocupa em fornecer assistência técnica aos índios?
Dia desses, a agência de risco Fitch rebaixou o Brasil novamente. Vá lá, mais para equiparar-se com o que já haviam feito outras agências internacionais do que em razão dos imensos desafios brasileiros - embora, por óbvio, tenha-se destacado os imensos desafios brasileiros. O que farão as agências quando descobrirem o tamanho do nosso abismo fiscal? Como reagirão os mercados? Há, realmente, alguma chance de reverter as expectativas e chamar o investidor externo para dar uma mãozinha perante quadro tão devastador?
E o Banco Central, a inflação? Muitos analistas brasileiros têm previsto queda gradual da inflação, queda que poderia, inclusive, acelerar possível movimento de queda dos juros. Será? Com o lado fiscal tão desconjuntado e a economia em tamanho estado de entropia, como reagirá o câmbio, e que efeitos isso terá sobre a inflação? Mais: se os desequilíbrios fiscais forem ordens de magnitude superiores ao que hoje se imagina, é praticamente impossível acreditar que a inflação haverá de ceder como muitos esperam, sobretudo porque ela torna-se instrumento fundamental para corroer ao menos uma parcela da dívida pública. Com inflação alta e desemprego elevado, o mal-estar da população brasileira beira o insuportável. Dia desses escrevi para o jornal O Estado de S. Paulo artigo em que calculava o Índice de Mal-Estar da classe C, a soma da inflação e do desemprego. Saibam que o Índice de Mal-Estar da Classe C é 40% maior do que o Índice de Mal-Estar da população brasileira como um todo.
Com agenda carregada de hercúleos desafios, esperava-se do timoneiro equipe de primeira, com a prometida redução de ministérios. Contudo, é com desgosto que leio nos jornais que estaria ele a fraquejar, cedendo ao insidioso fisiologismo, praga da política nacional. Sim, parece que teremos Henrique Meirelles na Fazenda. Mas, os trabalhos incompletos de Levy nos revelaram que reputações e credenciais não fazem milagres. Para atacar com vontade a lista de demências do governo de Dilma Rousseff é preciso que se forme time com capacidade técnica indiscutível, e habilidades políticas inquestionáveis. Onde está esse time, timoneiro? Por certo não na titubeação que se anuncia na imprensa.
A sociedade não irá tolerar incompetência, malemolência, ou qualquer outra "ência", ainda que não seja demência. Para o bem do país e do futuro governo interino, Temer precisa tomar com força a roda do leme, o timão. O risco de não fazê-lo é acabar como o timoneiro de Paulinho da Viola:
Não sou eu quem me navega
Quem me navega é o mar
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