Já fui Papai Noel por um dia. Na verdade, por algumas horas, para fazer uma reportagem. Troquei de lugar com o Papai Noel do shopping e recebi a visita de algumas crianças desconfiadas, sentindo-me, evidentemente, um legítimo farsante.
A parte mais dolorosa da experiência foi ter que aceitar a chupeta que um menininho de dois ou três anos me alcançava com ar relutante, estimulado pelo pai. Até hoje considero esse rito uma verdadeira crueldade com as crianças e também uma desconsideração para com o Bom Velhinho, que nunca mais irá recuperar a sua imagem diante do piá expropriado de seu objeto preferido.
Pois a notícia de que o governo federal está preparando um projeto de lei para proibir o uso de celulares nas escolas me fez lembrar daquele episódio dramático do pretérito Natal. Cassar o aparelhinho da gurizada, ainda que por algumas horas, será como tirar bico de criança. Pelo que dizem os especialistas e a própria Unesco, trata-se de uma medida urgente e necessária, pois a obsessão tecnológica está afetando fortemente o aprendizado, tirando a concentração da garotada e provocando dependência emocional.
Mas vai ser uma barra. No mínimo, teremos crises de abstinência. As pessoas estão de tal forma viciadas no brinquedinho digital —crianças, adolescentes e adultos — que caem em desespero quando ficam sem internet ou sem eletricidade para carregar a bateria.
Quem não lembra daqueles filas enormes nas tomadas dos shoppings durante a inundação? Além disso, nem todos os pais aceitarão pacificamente que seus filhos entreguem a chupeta digital para os professores ou para os servidores da escola. Vem controvérsia aí, podem ter certeza.
O problema é global. Vários países vêm debatendo essa questão, alguns já decididos pela proibição, outros optando por alternativas intermediárias como a obrigatoriedade de deixar o aparelho desligado na mochila. E sempre tem quem sonhe com aquela solução mágica, que raramente funciona, de utilização do celular no período de aula, como ferramenta de estudo e aprendizado.
Sinceramente, não sei como resolveremos esse dilema. De minha parte, prefiro mil vezes uma solução negociada à simples proibição, que sempre recende a autoritarismo. Só tenho certeza de uma coisa: o relator desse projeto, como o Papai Noel farsante, vai sair chamuscado.