
Tem de tudo na internet, até coisa inteligente. Recebi na semana passada uma brincadeira que viralizou e que me deixou muito impressionado, tanto pela criatividade dos internautas quanto pelo conteúdo das mensagens. O ponto de partida foi uma página de humor do Facebook (a Sebastião Salgados, que publica fotos de comidas em preto e branco). O inspirado redator propôs o Festival Miojo Literário a partir do seguinte diálogo:
— Você é escritora?
— Sou sim.
— Então fala “comi um miojo”.
— Aproximei meu corpo da mesa para ficar mais perto da tigela fumegante. A noite estava fria, nada cairia melhor do que aquela saborosa massa com ervas e especiarias. Dei a primeira garfada. Senti meu corpo ir ao céu com aquele maravilhoso carnaval de sabores em minha boca.
Tudo bem, gosto discutível (tanto o literário quanto o gastronômico). Só que, a partir daí, dezenas de usuários passaram a publicar diálogos imaginários de seus autores preferidos, sempre com a mesma formulação. Por exemplo:
— Você é Machado de Assis?
— Sou sim.
— Então fala “comi um miojo”.
— Bentinho observava como Capitu abria o pacote imaginando que ela escolheria um sabor, mas escolheu outro...
E assim apareceram trechos fictícios de obras de Sartre, Saramago, JK Rowling, Álvares de Azevedo, Stephen King, Dostoiévski, Carl Sagan, Clarice Lispector e dezenas de outros autores ilustres, com paródias de trechos de seus livros e imitações bem aproximadas de seus estilos. Claro que apareceram também algumas postagens críticas a políticos e autoridades, mas a maioria entrou no jogo pelo lado certo, demonstrando familiaridade com a literatura e respeito aos demais participantes.
Foi gratificante constatar que muitos brasileiros continuam lendo bons livros e bons escritores, e que essas pessoas, como costuma acontecer com leitores assíduos, desenvolvem a imaginação e a criatividade, ampliam o vocabulário e se tornam capazes de produzir verdadeiras pérolas. Uma delas, só para exemplificar:
— Você é Jorge Amado?
— Sou sim.
— Então fala “comi um miojo”.
— Rita anda ligeiro, balançando as cadeiras suadas, levando consigo a panela cheia de miojo. Os aromas do tempero e do suor de Rita se confundem debaixo do sol da Bahia...
O poder da literatura é mesmo imenso.