O escritor Paulo Coelho diz que a vida nos oferece todos os dias um momento em que é possível mudar tudo o que nos deixa infelizes – o chamado instante mágico. Nem sempre, porém, estamos atentos para captá-lo. Pois o repórter gaúcho Marco Aurélio Souza, da Globo, estava ligadíssimo durante o clássico entre Palmeiras e Corinthians, na semana passada. Da beira do gramado, enquanto a partida se desenvolvia, ele percebeu na arquibancada do Allianz Parque a cena sublime da mãe narrando o jogo no ouvido do filho cego, ambos vestidos com o uniforme palmeirense. A imagem foi ao ar na televisão, migrou para as redes sociais, emocionou milhões de pessoas em todo o mundo e até gerou uma notícia positiva para o Brasil no Exterior, coisa rara nos últimos tempos.
Foi tamanha a empatia despertada pelo menino Nickollas, que ele acabou sendo recebido nesta semana pelo técnico Luiz Felipe Scolari e pelos jogadores do Palmeiras, durante um dos treinos da equipe. O treinador conduziu-o pela mão até o centro do gramado e o apresentou a seus ídolos. O garoto foi abraçado por cada um dos atletas e ainda teve a oportunidade de identificá-los pelo tato, passando a mão na cabeça de um, tocando na barba de outro e conquistando o carinho de todos.
Nickollas tem 11 anos, autismo leve e deficiência visual acentuada. Nasceu prematuro, com cerca de 500 gramas, e não houve tempo para a formação das suas retinas. Abandonado pela mãe biológica, permaneceu quatro meses internado no hospital e chegou a ser rejeitado por 12 casais habilitados a adotar um bebê, até que apareceu a palmeirense Sílvia Grecco, que já tinha uma filha natural mas queria aumentar a família. Foi amor instantâneo, conta a torcedora, que também é generosa para justificar a desistência dos pretendentes que estavam na sua frente na fila de adoção.
– O motivo é que ele tinha que ser meu filho.
Agora, ela quer aproveitar o momento de visibilidade para promover um debate nacional sobre a inclusão de pessoas com deficiência em atividades sociais e no mundo do trabalho. Nas dezenas de entrevistas que vem dando, Sílvia passa lições de humanidade e desprendimento. Diz que aprendeu muito com o seu menino, mas que está tentando passar a ele o caminho da independência, pois sabe que um dia o jovem não poderá mais contar com os olhos dela para ver o mundo e os jogos do seu Palmeiras.
Sábia visão, concluo eu. E faço uma reflexão final sobre esse episódio comovente: o repórter teve o mérito de captar aquele instante especial que poucos percebem, a imprensa e as redes sociais cumpriram bem os seus papéis de divulgar o fato no tom adequado, Felipão e os jogadores demonstraram sensibilidade ao receber e homenagear o pequeno torcedor. Acabou sendo um gol de placa para o futebol brasileiro.
Mas o exemplo dado pela mãe de Nickollas é a verdadeira magia desta história.