Estou convencido de que essa quebra generalizada das finanças públicas tem origem também na repulsa à matemática pelos estudantes brasileiros. Os jovens consideram uma chatice debruçar-se sobre números, ainda mais agora que as maquininhas e os computadores resolvem tudo sem que seja preciso acionar um único neurônio. Na verdade, sempre foi assim: antes da calculadora, também odiávamos essa ciência das abstrações que, paradoxalmente, expressa a precisão, a eficácia e a verdade. O resultado não poderia ser outro: governantes e administradores incompetentes para fechar as contas no azul.
Claro, existe também um componente moral na crise financeira que não pode ser ignorado. Algumas pessoas, antes mesmo de entrarem na política, repudiam a matemática mas usam as quatro operações de acordo com suas conveniências. Dizem que vieram para somar, mas tornam-se especialistas em subtrair o que é de todos e em multiplicar o próprio patrimônio. Raramente dividem alguma coisa. O resultado dessas deformações individuais é que, depois, as contas não fecham, os governos gastam mais do que arrecadam e o país patina no charco da corrupção e do atraso.
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Não sou um fanático por números, mas gosto de contas bem feitas e aprecio, acima de tudo, histórias matemáticas bem contadas, aquelas que misturam literatura e resultado comprovado. Já mencionei aqui – e menciono de novo como uma de minhas preferidas – a narrativa dos 35 camelos de Malba Tahan. Seu personagem, o homem que calculava, encontrou três irmãos brigando por causa da herança deixada pelo pai, 35 camelos que deveriam ser divididos da seguinte forma: metade para o mais velho, a terça parte para o do meio e a nona parte para o caçula. Cálculo impossível.
Para não despedaçar os camelos, o calculador juntou à cáfila um animal pertencente ao seu amigo e fez a divisão exata. Todos lucraram. O irmão que receberia 17 camelos e meio recebeu 18, o que receberia 11 e um pedaço recebeu 12, e o que receberia três e parte recebeu quatro. E ainda sobraram dois animais, um para devolver ao amigo que o emprestara para a divisão e outro como lucro – ético e consentido – para o articulador da operação.
Como prega uma definição bem-humorada e incongruente, a matemática é feita 50% de fórmulas, 50% de provas e 50% de imaginação.