O tamanho do jogo é maior do que palavras possam registrar numa coluna? Não é só o continente paralisado das 17h às 19h deste sábado (23). A torcida inglesa vai ver o jogo ao vivo. Em Portugal, terra do treinador flamenguista, o Flamengo virou uma extensão afetiva, embora estes laços de pátria existam na origem do Vasco da Gama e não do Flamengo. Do lado argentino, há uma reverência legítima à figura de Gallardo, condutor brilhante do River Plate até mais uma final de Libertadores e cotado, segundo as boas línguas, para treinar o Barcelona.
Embora haja protagonistas em grande número dentro do campo, é do lado de fora que estão os comandantes dos caras que fazem gols, armam jogadas e impedem gols. Cada um do seu jeito, cheios de pontos de contato na carreira e muito mais opostos na trajetória de Gallardo e Jorge Jesus. A diferença mais escandalosa está anterior à carreira atual. Gallardo, diferentemente de Jesus, foi um monstro de jogador de bola. Seu rival não passou do medíocre de chuteiras nos pés.
O que também é diferente entre eles é que Gallardo virou um leão de copas. Ganhou Sul-Americana, Libertadores, copas argentinas... Sente o cheiro do jogo e mexe no seu time com precisão suficiente para transformá-lo. Jesus, ao contrário, soma títulos de pontos corridos com o Benfica em Portugal, o mesmo título nacional que ganhará pelo Flamengo em 2019. Nas decisões de Copa que teve, perdeu.
Uma terceira diferença entre Gallardo e Jesus está na irredutibilidade do conceito. Gallardo gosta do jogo ofensivo e, se puder, faz uso deste modelo como prioridade. Porém, nos casos em que percebe a impossibilidade de jogar do seu jeito, molda seu time feito camaleão em busca do resultado desejado. Jesus, ao contrário, não negocia nada. Vai ganhar ou perder do seu jeito, que nada mais é do que atacar ininterruptamente numa intensidade maluca. Não desorganizado, mesmo que doido. Sua equipe, via de regra, se defende bem, mas muito por estar sempre com a bola tentando construir.
O ponto que mais aproxima os técnicos finalistas da Libertadores me parece também o mais glamouroso. É da natureza humana gostar de ser reconhecido pelo talento. Gallardo e Jesus são, em novembro de 2019, unanimidade entre suas nações de torcedores. A idolatria a Gallardo está mais sedimentada, são mais de cinco anos comandando abaixo de faixa no peito um time gigantesco da Argentina onde, como jogador, já tinha sido ídolo. Nada arranha o tamanho de Gallardo, que virou estátua no River Plate como Renato Portaluppi virara antes no Grêmio.
Por outro lado, Jorge Jesus alcançou em tempo fulminante corações e mentes flamenguistas. Teve 20 dias para trabalhar, recebeu Rafinha, Filipe Luís, Mari e Gérson como reforços e conseguiu agregá-los num nível extraordinário de desempenho. Teve a vida facilitada com a lesão de Diego, o time se arrumou no meio sem traumas. Além de fazer o Flamengo ganhar, Jorge Jesus tem feito o Flamengo encantar. Tudo muito rápido, daí também as cores vivas do entusiasmo da torcida do Flamengo com seu treinador.
Vou parar para ver Flamengo x River Plate na RBS às 17h deste sábado desfrutando cada minuto do que os dois times podem dar. Não sem antes torcer para que não tirem o olhar do que tem valor, a bola, em nome de tentar qualquer tipo de artimanha que puxe para o antijogo ou a suposta malandragem. É um risco que se corre, são 22 milhões de dólares em jogo. Se a partida for normal, o Flamengo ganha. O que houver de fora da curva só pode beneficiar o River Plate. Desfrute você também.