"O mundo inteiro sempre falou da Amazônia. Agora, a Amazônia está falando por si." Foi assim que o presidente Lula encerrou no ano passado o discurso sobre Meio Ambiente na abertura da Assembleia Geral da ONU. Nesta terça-feira (24), o mandatário brasileiro retornará ao púlpito da conferência e renovará os apelos para que o pacto global sobre o clima seja mais efetivo. Mas terá dificuldade em provar que o Brasil vive, de fato, outro momento na preservação ambiental. A seca extrema e a profusão de incêndios pelo país ganharam o noticiário internacional, e mancham a imagem de um governo que prometia ser exemplo para o mundo.
É verdade que as mudanças climáticas e os altos níveis de emissão de gases em outros países têm impacto no Brasil, e que os problemas neste ano também estão na conta de outros governos que reduziram investimentos em prevenção e desprezaram os alertas da crise climática. Mas Lula já ocupa a presidência há quase dois anos, e não pode negar que muitas queimadas poderiam ter sido evitadas pelo poder público.
No discurso do ano passado, o presidente chegou a Nova York munido da reputação internacional que conquistou nos dois primeiros mandatos. Tinha em mãos números expressivos de redução do desmatamento da Amazônia no começo do atual governo. Anunciou a retomada de “uma robusta e renovada agenda amazônica, com ações de fiscalização e combate a crimes ambientais”.
Com toda esta mudança de rumo, não foi possível impedir tantos casos de incêndios criminosos? Os alertas sobre a seca severa não são de hoje, e no ano passado já afetaram fortemente moradores do Centro-Oeste e da região amazônica. Como explicar que foi necessária a ação de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) para a liberação de recursos quando as florestas ardiam em chamas há vários dias?
Além da degradação ambiental e dos problemas de saúde pública, as queimadas agravam um cenário que já era preocupante para o setor produtivo nacional: a implementação da lei antidesmatamento pela União Europeia a partir de 2025. O tema é foco de reuniões bilaterais do presidente Lula com autoridades do bloco nesta semana.
Os países europeus prometem a aplicação de regras rigorosas para importação de commodities, como carne e soja. Segundo o governo brasileiro, a medida impacta 30% das exportações brasileiras. Será exigido, por exemplo, que os produtos importados para o mercado europeu tenham origem conhecida, com relatórios incluindo dados georreferenciados, fora de áreas desmatadas a partir de 2021.
Esperava-se no governo que o compromisso que Lula externou em combater ilegalidades ambientais ajudasse a sensibilizar as autoridades estrangeiras. Até agora, no entanto, os pedidos para adiamento da aplicação da lei foram ignorados.
Além de cobrar (com razão) os países ricos a colaborarem no financiamento da preservação das florestas, Lula precisará sair da Assembleia da ONU disposto a mostrar resultados em seu quintal. Caso contrário, repetirá o modelo de tantas conferências internacionais, que desenham um mundo lindo e próspero nos discursos sem nenhuma ação prática para alcançá-lo.