“Muita vida te aguarda, muita vida te procura.” São versos do poeta português Joaquim Pessoa, que fazem parte do poema A um Passo do Amor. Escolhi começar assim a última crônica do ano, pois a ideia de que muita vida nos aguarda faz bem para o espírito. O futuro às vezes é associado ao fim, e não a mais vida.
É bem verdade que este início de ano nos pega com os dentes trincados: o primeiro dia de janeiro inaugurará um novo estilo de governo e seja o que Deus quiser – mesmo, já que Deus estará sendo representado no primeiro escalão. Que não se faça muita bobagem em nome Dele.
Mas não terei o mau gosto de falar de política neste fim de semana. Realidade demais cansa, e estamos exaustos deste 2018 esgotante. Pausa. Trégua. Hora de embarcar na poesia dos fogos de artifício e dos abraços à meia-noite, confiando no conceito de renovação: 2019 há de ser o ano em que viveremos tudo – exceto as mesmas coisas de sempre, combinado?
Que a gente valorize os relacionamentos acima de outros interesses, principalmente dos interesses de Mark Zuckerberg. Que a gente aprenda a ouvir, a escutar profundamente, considerando as necessidades de quem nos cerca. Que a gente sirva a quem tem menos do que nós: nossos sofrimentos diminuem quando damos atenção à dor alheia. Que tenhamos um ano mais light, sem tanto bate-boca virtual, sem patrulha, sem grosserias generalizadas. Reatemos os laços. Que nossas irritações momentâneas não reduzam nosso plantel de afetos.
Que resgatemos na memória os acontecimentos da nossa infância para compreender melhor o modo como nos comportamos hoje, que deixemos de lado as máscaras que escondem nossos sentimentos e sejamos mais francos, sem receio de expor nossas fragilidades. Que tratemos bem de nós mesmos, mas sem deixar que a vaidade fique maior do que a lucidez. Que usemos mais cores, que pratiquemos muitos esportes e exercícios, mas sem esquecer de privilegiar o conhecimento e de defender a arte livre quando ela estiver sendo ameaçada.
Que a gente descanse. Durma mais. E ame, ame, ame sem receio de parecer um bobo. Que a gente atraia os outros com uma atmosfera mais pacífica, generosa, risonha. Que sejamos mais inventivos e originais, que sejamos eficientes por meio da criatividade, não por meio da força bruta, da energia mal canalizada. Que não façamos nada da marra, que não violemos nossa essência primária. Sem querer ser retrô, mas já sendo: voltemos a valorizar o mundo artesanal. Muita vida te aguarda, muita vida te procura, diz o poema.
Confie nisso. Ao findar do último minuto de segunda-feira, diga adeus aos tutoriais (este, inclusive) e siga sua intuição, seu olfato, seu radar, até localizar pessoas de bem e as oportunidades surpreendentes que estão a um passo, esperando pelo seu sim.