Depois dos escabrosos detalhes do Punhal Verde Amarelo, o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro não choca, sequer surpreende. Nem seus filhos se deram ao trabalho de negar a conspiração golpista. Ao contrário, retomaram a alegação de que não seria possível puni-la por não ter sido bem-sucedida.
É bom lembrar, neste momento grave da vida nacional, que o principal indiciado pela Polícia Federal (PF) defendeu golpe publicamente, antes de ser advertido que poderia sofrer impeachment e passado a prometer que se manteria nas "quatro linhas da Constituição".
Também é bom lembrar o que significa "indiciar": submeter a inquérito diante de indícios de crime. Depois, em outra fase, virá – ou não – a denúncia, que cabe à Procuradoria-Geral da República (PGR). Tudo a seu tempo. Ou, como se trata de um líder que se serviu várias vezes de citações bíblicas, como diz Eclesiastes 3:18: "Há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de colher".
Conforme o senador Flavio, "por mais que seja repugnante pensar em matar alguém, isso não é crime."
Segundo o deputado Eduardo, "se a execução não começou, não há que sequer falar em tentativa".
A "linha de defesa", portanto, não passa pela negativa, nem pela fragilidade estratégica - digamos assim - do plano que incluía o assassinato de líderes eleitos. O que a PF expôs, até agora, é que um grupo de militares - um dos quais, Mário Fernandes, ocupava o segundo cargo na hierarquia da Secretaria-Geral da Presidência – pediu licença para Bolsonaro para agir.
Conforme descrição de 2020 (leia aqui), a função da Secretaria-Geral era "assistir o presidente da República na condução estratégica de governo e prover o suporte para o alcance dos objetivos institucionais da Presidência da República".
E Fernandes disse, ao então ajudantes de ordens, Mauro Cid, que segundo Bolsonaro "qualquer ação nossa (deles) pode acontecer até 31 de dezembro". O que separa uma narrativa de uma "narrativa" é sua coerência. Não falta coerência ao indiciamento de Bolsonaro.