Com shows diários - musicais e de oratória -, na convenção democrata que sela nesta quinta-feira (22) a candidatura para a presidência dos Estados Unidos, só Kamala Harris disputa protagonismo com o Federal Reserve (Fed, BC dos EUA) no GPS da economia.
Além de quando o juro americano começa a baixar, o segundo debate internacional mais relevante é sobre os contornos do "Kamalanomics" como é chamado o programa econômico da candidata que já ultrapassou o adversário Donald Trump em pesquisas de opinião.
— O fortalecimento da classe média é o objetivo que definirá minha presidência — anunciou Kamala (pronuncia-se Kâmala, sempre é bom lembrar) assim que o presidente dos EUA, Joe Biden, desistiu de disputar a reeleição.
Como a classe média nos EUA representa a maioria do eleitorado, essa é uma frase típica de campanha, desenhada para conquistar o maior número possível de votos. E também para se contrapor a Trump, visto como um presidente que governou para os ricos.
O que se diz nos bastidores é que Kamala quer, sim, manter os planos de Biden de estimular a indústria, atualizar a infraestrutura e incentivar a geração de energia renovável.
Parece razoável, mas a percepção de mercado sobre a economia americana mudou de "resiliente" para "em risco de recessão" em poucas semanas, e agora voltou a ser de desaceleração controlada. E "resiliente", nesse caso, era um problema, porque adiava o início do corte no juro.
Além disso, pesquisa recente mostrou que cerca de 60% dos americanos - uma sólida maioria - querem que Kamala abandone o Bidenomics ou faça mudanças substanciais nos programas estimados em US$ 3,5 trilhões.
Embora os incentivos da Casa Branca em quase quatro anos tenham alimentado o motor econômico do planeta, agravaram a já enorme dívida pública dos EUA, que equivale 123% do PIB. E abasteceram a inflação, no mandato de Biden foi a mais alta dos últimos 40 anos.
É por isso que na exposição mais clara do plano econômico de Kamala, sexta-feira passada (16), os pontos que mais chamaram atenção foi o aumento da aposta em incentivos fiscais em um país já muito endividado e a defesa de uma lei que proíba a especulação de preços de alimentos.
Por opositores, chegou a ser comparada a Nicolás Maduro. Mas analistas lembraram que Estados como o Texas - não exatamente progressista - têm regras que proíbem "preço exorbitante ou excessivo" em alimentos e combustíveis durante desastres. Discordar, quem há de?
Mas como a ideia não foi detalhada, alimentou comparações também com um dos menos respeitados ex-presidentes dos EUA, Richard Nixon, que enfrentou a maior inflação desde o período entre guerras.
Para tentar combatê-la, mudou todo o sistema financeiro internacional antes de ser derrubado do cargo, pouco mais de um ano depois da reeleição, pelo célebre escândalo Watergate.
Para o Prêmio Nobel de Economia Paul Krugman, Kamala é "moderadamente de centro-esquerda". Para seu opositor, é uma "extremista". Até novembro, uma imagem nesse intervalo deve se consolidar.
Um resumo das propostas econômicas
- Aumento de crédito fiscal para famílias de baixa renda com crianças
- Incentivo fiscal para construtoras na venda da primeira casa própria
- Crédito de imposto para compradores da primeira casa própria
- Expansão de incentivo fiscal para construção de residências mais baratas
- Corte de benefício fiscal para investidores que detêm várias unidades residenciais
Leia mais na coluna de Marta Sfredo