Ex-secretário da Fazenda que marcou sua gestão por conseguir sucessivos resultados de déficit zero no Estado, Aod Cunha agora defende a necessidade de tratamento especial às finanças para que seja possível socorrer e reconstruir o Rio Grande do Sul com a urgência necessária. Considera promissora a abordagem dos líderes dos três poderes sobre o tema durante visita ao Estado no domingo, que acenaram com uma proposta de emenda constitucional para reduzir a burocracia na liberação de recursos, mas argumenta que transparência é uma necessidade tão grande quando a agilidade.
As promessas de via rápida para o socorro ao RS feitas no domingo pelos três poderes são viáveis?
Uma parte mais emergencial, sim. Há fontes de recursos para isso. Mas a maior parte dos recursos necessitará antes de uma discussão mais rigorosa sobre o montante total de recursos e a governança para liberação, aplicação e acompanhamento de resultados. É preciso que o senso de urgência seja equilibrado com a eficiência e transparência no uso dos recursos.
É preciso construir uma governança que tenha capacidade técnica elevada de diagnósticos rápidos e consistentes, elaboração e execução de projetos que vão da reconstrução de infraestrutura.
O melhor caminho é mesmo uma proposta de emenda constitucional, ou haveria outro?
O melhor é estabelecer um entendimento entre Judiciário, da parte do Supremo Tribunal Federal (STF), governo federal, Congresso , Tribunal de Contas da União (TCU) e órgãos equivalentes no Rio Grande do Sul. A pandemia de covid já nos mostrou que, mesmo com o teto de gastos, havia conforto jurídico para excepcionalizacao de liberação de recursos frente a uma catástrofe. A Lei do Teto de Gastos já previa isso. O atual arcabouço fiscal, em tese, é inclusive menos rígido em relação a isso. De qualquer forma, claro que uma emenda constitucional traria mais conforto. Mas é preciso avaliar a relação custo/beneficio com o tempo que se levaria para aprovar uma emenda assim (dois turnos na Câmara, dois turnos no Senado).
Como garantir que, se as restrições burocráticas forem removidas, o dinheiro vá para onde é necessário e não haja desvios?
Esse é o maior desafio, maior até do que a obtenção do volume de recursos necessários. Primeiro, é preciso construir uma governança que tenha capacidade técnica elevada de diagnósticos rápidos e consistentes, elaboração e execução de projetos que vão da reconstrução de infraestrutura, recuperação de renda de famílias e empresas, replanejamento das condições de enfrentamento das mudanças climáticas, rediscussão de ocupação do solo e áreas urbanas nas regiões mais afetadas, entre outras frentes. É algo de dimensão que o setor público brasileiro, não só no Rio Grande do Sul, não viveu ainda. E por último, e talvez o mais importante, dar muita transparência na aplicação dos recursos. O modelo de governança precisa ser inteligente o suficiente para permitir que a agilidade não destrua o apoio que a sociedade precisa dar. E isso exigirá mostrar um padrão muito elevado de seriedade e integridade no esforço de reconstrução do Rio Grande do Sul.