Ela embala grandes projetos de clientes, nos últimos anos inclusive com trabalhos em série fora do Brasil mas não gosta muito de falar sobre a sua própria trajetória. Eliana Azeredo, fundadora e presidente da Capacità, diz ter saído "do nada" para montar eventos que representam o Brasil no Exterior. Já organizou estandes que representaram o país em feiras industrias setoriais e, por três anos seguidos, na maior conferência anual do clima, a COP. Tudo começou, relata, quando se sentia ociosa como secretária na Cia. Zaffari, onde aprendeu até a fazer pacotes de presente com "dona Dulce", uma das matriarcas da rede gaúcha de supermercados.
Quando a Capacità começou a fazer eventos fora do Brasil?
Já feito a noite do Brasil há cerca de 15 anos no Fórum Econômico Mundial, em Davos (Suíça), mas foi só uma vez. Em 2019, começaram a surgir oportunidades, como um projeto em Hanover, outro em Paris, ambos espaços brasileiros em feiras de negócios. Mas aí veio a pandemia, e sofremos horrores. Tudo parou.
Como está a retomada?
Voltou muito forte. Se tem uma coisa de que não podemos reclamar é desse mercado, as pessoas estão com necessidade de estar em eventos. Fizemos a COP (a Conferência do Clima global) por três anos, vamos para o quarto, estamos fazendo reservas em Baku, nem sei direito onde é... (Azerbaijão). É uma experiência que só posso comparar a Davos. Na primeira COP, a do Reino Unido, ainda foi com todo mundo fazendo teste a cada dia para entrar no evento.
Como foi a experiência nas COPs?
A gente não esperava, de verdade. É uma experiência muito rica, mas sem nenhum glamour. Fazer Egito e Dubai foi carregar mesa, cadeira...
Para Dubai, fui com uma equipe de 12 pessoas, sofri, sofri e sofri, mas quando o cliente chegou estava tudo resolvido.
Mas como, não tem uma enorme infraestrutura?
Embora quem contrate mão de obra sejam grandes organizações, quando chegamos temos de nos conectar com equipes subcontratada locais, com baixo nível de profissionalismo, muita falta de experiência e de preparo. Para Dubai, fui com equipe de 12 pessoas, sofri, sofri e sofri, mas quando o cliente chegou estava tudo resolvido. Temos experiência e jogo de cintura. Como não posso levar 50 pessoas daqui, a gente costuma usar muito a rede local de brasileiros que trabalham em cada país. Geralmente, é gente muito profissional. A segunda COP que fizemos, no Egito, foi a entrada definitiva nos eventos internacionais. A equipe conseguiu fazer coisas incríveis. Hoje temos 70% dos eventos fora do Estado. Mas sempre digo que devo isso ao Rio Grande do Sul. A empresa vai fazer 30 anos em 2025 e faz eventos nacionais desde o segundo ano de atividades. Para o primeiro, fomos com dois ônibus de pessoas do RS para o Rio, porque não dava para pagar avião.
E como tudo começou?
Eu era secretária do Marcelo Zaffari (um dos líderes da Cia Zaffari), sou de Passo Fundo. Queria ganhar mais e achava que ficava muito tempo ociosa, quando tive tempo aprendi até a fazer pacote de presente com dona Dulce (uma das matriarcas do grupo). Aí a empresa começou a trabalhar no lançamento do Zaffari Higienópolis e pedi para atuar com a equipe que havia sido contratada, a Office Marketing, e fazia coisas como datilografar etiquetas para 3 mil convites. Algum tempo depois, o Josemar Basso, que era da Office, me convidou para ir trabalhar com ele. Pedi demissão do Zaffari e fiquei nove anos na Office, virei sócia minoritária. Só saí para abrir a Capacità em 1995 porque sempre quis empreender.
Quem contratava não conversava comigo, nunca atitude que era claramente 'o que mulher entende?'. Aí quis provar que sabia fazer e trabalhar na área empresarial.
Foi um começo tranquilo?
Foi bem atrapalhado. Abri, distribuí cartões e, quando fui registrar, descobri que não podia, já havia outra empresa com o nome que eu queria. Depois, fazer eventos como mulher, no início, foi muito complicado. Tinha mais eventos médicos e queria mais os empresariais. Quem contratava não conversava comigo, nunca atitude que era claramente 'o que mulher entende?'. Aí quis provar que sabia fazer e trabalhar na área empresarial.
Foi possível superar?
Sobre o nome, me tranquilizaram dizendo que iriam contratar a Eliana, a pessoa, mais do que a empresa, porque é uma questão de confiança. A área de eventos tem muitas responsabilidades, é um show ao vivo, se errar não tem repeteco. E hoje, minha empresa tem 12 pessoas, 12 mulheres, que dominam esse segmento. A gente só cresceu. Teve dificuldade? Teve, muita. Mas ganhamos a confiança do mercado. Sofri muito, mas hoje estou muito feliz com o Rio Grande do Sul, especialmente Porto Alegre. A gente ainda perde muita coisa para outros Estados. por não ter um centro de eventos grande e modulado, para acomodar bem 5 mil ou 500 pessoas. Isso me fez muito ir para fora, porque minha equipe é ambiciosa, quer crescer, conquistar novos clientes. Sou muito agradecida ao mercado, a entidades empresarias, às de eventos. Devo minha trajetória ao mercado. sa[i de Passo Fundo, do nada, sozinha.
O tempo todo é preciso mostrar que a gente sabe fazer. Ainda tem quem me pergunta se meu sócio é meu marido. Não é.
Essa desconfiança com mulheres à frente dos negócios desapareceu ou só diminuiu?
(responde rápido) Diria que melhorou 70%. Ainda precisa melhorar, evoluir muito. Tenho 65 anos, até os 30 não sentia preconceito, mas na verdade não tinha consciência. O tempo todo é preciso mostrar que a gente sabe fazer. Ainda tem quem me pergunta se meu sócio é meu marido. Não é. Tenho 11 sócias, porque todas têm participação no lucro. E temos de perseguir diversidade e sustentabilidade. Não dá mais para dizer "não consigo ter uma equipe diversa". Também odeio bater nessa tecla, adoro homens e trabalhar com homens, mas ainda é preciso trazer, para o cliente e para o trabalho. Meus clientes são, na maioria, homens.
E qual deve ser o futuro da Capacità?
Se este ano for parecido com 2023, será maravilhoso. Foi nosso melhor ano. Acabei envolvida com várias entidades, como a Abrape (Associação Brasileira de Produção de Eventos). Na pandemia, trabalhamos horrores para garantir a sobrevivência das pessoas que trabalhavam no segmento. Durante um ano, distribuí 50 cestas por mês para a equipe, para carregadores, recepcionistas e outros públicos que dependem da atividade. Nossa área não se dava importância, não sabia de números. Era só um aglomerado. Mas aí nos unimos e conseguimos o Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos). Fui a Brasília, trabalhamos nisso. Salvou muitas empresas e ajudou outras como a minha.
Ouvimos que teve gente usando errado, mas não sei se é verdade. Se foi, prejudicou muito o setor. A Abrape se manifestou dizendo que, se tiver, tem de apontar quem está fazendo. Inclusive para não prejudicar quem está sobrevivendo com eventos.
Mas agora a procura não voltou a pleno, como você relatou?
Em 2019 fiz 52 eventos, em 2020 tinha 38 previstos e não recebi um real. Claro, 2023 foi o melhor ano da minha empresa, todo mundo voltou querendo fazer tudo. Mas muita gente ficou no caminho, quebrou. Agora, o custo dos fornecedores está mais alto, tivemos de rever sistemas de trabalho. O mercado voltou mas mudou. Não há muito mais eventos para 3 mil, 4 mil participantes, os clientes estão mais exigentes.
O segmento reconhece que houve fraudes no uso do Perse, como sustenta o governo?
Ouvimos que teve gente usando errado, mas não sei se é verdade. Se foi, prejudicou muito o setor. A Abrape se manifestou dizendo que, se tiver, tem de apontar quem está fazendo. Inclusive para não prejudicar quem está sobrevivendo com eventos. É um setor que dá muito emprego. Eu tenho minhas 11 sócias, o restante a gente contrata por evento, são até 300 de fora. É por isso que o setor começou a se estruturar há pouco tempo.