Dez dias depois de anunciar o fim da Paridade de Preços de Importação (PPI), o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates fez sua primeira visita a uma refinaria - no cargo, como fez questão de ressaltar. No Estado, fez a confirmação oficial de que a Refap não será privatizada e reservou alguns minutos para essa entrevista exclusiva à coluna. De sexta-feira (26) até esta segunda (29), teve compromissos familiares, porque esse carioca que adotou o Rio Grande do Norte também tem um pé no Rio Grande do Sul.
O projeto de Rio Grande é específico ou pode ser piloto para outras unidades?
Será piloto para outras unidades. Faz parte de uma das diretrizes que definimos ao assumir a Petrobras. Como existe um plano estratégico (que define os investimentos da estatal) da gestão anterior, quando assumimos fizemos três processos paralelos. O primeiro foi divulgar seis diretrizes da nova gestão que se comunicassem com o que a gente vai fazer no futuro, sem mexer no plano estratégico. O segundo, empregando um precedente usado pelo Pedro Parente (presidente da Petrobras na gestão Temer), que também assumiu no meio de um ano, em ruptura, é a possibilidade de ajustar o plano em andamento. Entre junho e julho, termina esse trabalho. E outro é revisar o plano, como se faz todos os anos, com vista ao período de 2024 a 2028.
Haverá novas refinarias?
A primeira opção não será construir refinarias. O biorrefino é parte de umas das diretrizes relacionada ao futuro. Não vamos construir novas refinarias velhas, ou seja, não vamos fazer refinaria clássica, que daqui a 30 anos ou menos estará obsoleta. Poderemos reformar, aprimorar e ampliar refinarias existentes, dentro de suas instalações. Vamos olhar para dentro, ver o que temos, como obras a terminar, a exemplo de Rnest e Comperj, ou aprimoramentos que deixaram de ser feitos - como aqui mesmo, na Refap, por estar à venda. As oito refinarias colocadas à venda tinham congelado seu investimento, inclusive para pintar um mero tanque. Até projetos sociais estavam condenados, porque haviam dado ordem de que todos os ativos à venda tinham de parar essas atividades um ano antes. Não faz sentido, e é uma maldade, porque não se descontinua de supetão. Então, vamos reformar, ampliar e aprimorar as refinarias dentro das próprias instalações, como sempre digo, sem comprar um naco de terra.
A primeira opção não será construir refinarias. poderemos usar capacidade de refino fora do Brasil ou complementar com refinaria nova, mas 'nova nova'.
Como será a expansão?
Se com essas iniciativas a gente não atingir a meta, que vamos estabelecer com o governo, de buscar certo conforto ou até autossuficiência em combustíveis, poderemos usar capacidade de refino fora do Brasil ou complementar com refinaria nova, mas 'nova nova'. Ou seja, onde já exista área ou tenha sinergia com refinaria já existente, podemos ter nova unidade voltada para o refino do futuro, seja petroquímica com biocomponentes, biorrefinaria ou hidrogênio. São três hipóteses para responder às pressões das sociedade para maior autossuficiência de combustíveis. Nossa diretoria de refino já estudou e arrisca dizer que temos duas Reduc (Refinaria Duque de Caxias, no Estado do Rio), o que equivale a quase meio milhão de barris/dia, de potencial de ampliação de capacidade dentro do nosso próprio parque de refino hoje.
E como Rio Grande entra nessa equação?
Essa refinaria não era nossa, entrou na Petrobras via operação de fusão e aquisição. Viramos sócios da menor refinaria do Brasil, a única que não era nossa fora Manguinhos (no Rio), que é pré-Getulio (Vargas, que criou o monopólio da Petrobras) e tem a configuração da época. Pela escala, não apetece muito fazer uma grande refinaria ali, nunca apeteceu, não é uma questão da Petrobras. A gente pega a transição energética, que está voando aqui do outro lado e pensa 'que se pode fazer com essa instalação?'. Nem sócio majoritário a gente é. O que temos? Tecnologia, temos o Cenpes (Centro de Pesquisas, Desenvolvimento e Inovação da Petrobras). Então, em vez de fechar essa refinaria, como os sócios poderiam querer, ou nós mesmos, ou usar só o terminal, vamos tentar dar uma nova vida a ela. Vamos ressuscitar essa refinaria em termos de perspectivas futuras. Pega o craqueamento verde, o FCC verde, e vamos testar aqui. A refinaria não tem nada a perder, só tem a ganhar com isso.
Fazer petroquímicos verdes é um plano da Petrobras para o futuro?
Seria um gancho para o futuro. Se será um interesse de maior escala, vamos decidir com base nesse piloto, que não é nem uma alavanca, é um ponto de apoio para o futuro. Mas é muito importante para Rio Grande, um alento, uma nova perspectiva de continuidade de investimentos.
É impossível uma empresa de petróleo pensar em transição energética sem passar pela petroquímica.
A Petrobras tem interesse em petroquímicos em geral?
O plano estratégico hoje não permite que a gente faça grandes elucubrações sobre projetos petroquímicos. Queremos alterar particularmente esse capítulo. Não posso dar detalhes, porque ainda não alteramos. Mas afetaria muito o mercado ou ofenderia muito algum agente se a gente dissesse que vai analisar petroquímica? Não. Por mais paradoxal que pareça, petroquímica é parte da transição energética. É deixar de queimar petróleo, um produto nobre, para transportar gasolina em caminhões a diesel. O futuro na transição energética passa, entre outras coisas, pela petroquímica. Com a eletrificação, o primeiro produto que vai sobrar, no futuro, é a gasolina. Vai ser preciso reconfigurar refinarias. É impossível uma empresa de petróleo pensar em transição energética sem passar pela petroquímica. O plano estratégico está anacrônico. Outros pontos nem critico tanto, mas tirar empresa de petróleo da petroquímica esse é inconcebível.
Sobre o fim da PPI, o que vai acontecer quando o petróleo subir?
A gasolina e o diesel vão subir, em algum momento, mas não na proporção que era antes e não no tempo real que foi. Algumas pessoas entraram em um túnel ilusório em que, só porque o Lula é presidente, o Jean Paul está na Petrobras, o Alexandre (Silveira) está no ministério (de Minas e Energia), diesel e gasolina nunca mais vão subir. Não é verdade. Ninguém nunca prometeu isso. O que nos comprometemos a fazer, juntos, foi abrasileirar os preços. E isso não tem nada de feio. Significa praticar preço de mercado brasileiro. O preço do Big Mac é abrasileirado. Por que o preço do diesel produzido aqui não pode ser abrasileirado? Significa que ele atende ao poder de compra do brasileiro, ao fato de haver componentes brasileiros naquela produção - há custo em dólar, mas é minoria - e atende aos interesses do Brasil, que correu atrás da autossuficiência em petróleo e da quase autossuficiência de derivados. Abrasileirar preços não significa isolar o Brasil do mercado internacional e perder a referência internacional.
Eu reconheço que o Ibama novo não é o Ibama de Bolsonaro. Agora, tem muito mais critério e legitimidade para nos exigir o que for.
Por que é fundamental perfurar um poço para ver se há petróleo na Margem Equatorial?
Para saber se ali tem petróleo. Nossos geólogos estão assim que nem menino na cerca, olhando para o outro lado e pensando 'na Guiana, acharam petróleo, mais para o Suriname, na Guiana Francesa também, a gente tem de dar uma furada ali para ver o que tem'. Eles estão assim não foi porque Deus deu bom tempo, não. A Petrobras entrou na concessão federal.
É estratégico, um novo pré-sal?
Isso eu não posso dizer. Petróleo, a gente só sabe quando fura.
Foi feita pesquisa sísmica (guardadas as proporções, algo semelhante a um ultrassom, ou seja, um diagnóstico menos invasivo)?
Foi feita, na década de 1990.
Uma nova não ajudaria?
Não sei se ajuda muito, tem de perguntar aos geólogos. Esse caso não é só técnico, houve mudança de gestão. E não estou culpando a mudança de gestão, estou compreendendo que a nova gestão tem o direito de colocar seus parâmetros. Eu disse isso a Marina e ao (Rodrigo) Agostinho (presidente do Ibama). A gente se dá bem, a gente se dá muito bem. Eu reconheço que o Ibama novo não é o Ibama de Bolsonaro. Agora, tem muito mais critério e legitimidade para nos exigir o que for. Se quiser colocar oito navios em vez de seis, a gente vai corrigir o processo. Não estou usando a teoria do fato consumado, mas tentando fazer a a do fato corrigido. Quero, com eles, corrigir o fato e furar um poço apenas, exploratório, e dizer 'tem óleo, não tem óleo'. Se me disserem 'Jean, não dá nem para furar o poço, não dá pra revisar nada', está bem. Ninguém vai encrencar com isso. Só que a gente tem o direito a fazer o recurso administrativo. E o dever.
Se chegar ao final desse período e o Ibama disser 'não vai furar', eu digo 'beleza, obrigado, até mais'.
O que havia sido combinado não era começar tudo de novo?
Saímos da reunião com o acordo de que íamos tentar corrigir. É que ela (Marina) vê como um novo pedido de licença, e nós vemos como um recurso administrativo. Tem de ser recurso administrativo. A governança, TCU, tudo isso, manda que nós não cessemos de tentar na primeira negativa. É obrigação do gestor, uma vez que estava se encaminhando uma APO, avaliação pré-operacional. Na véspera do simulado, vem o Ibama e denega a licença. Só estamos pedindo para discutir um pouco mais as questões. Se chegar ao final desse período e o Ibama disser 'não vai furar', eu digo 'beleza, obrigado, até mais'.