Era esperada uma reação negativa da bolsa ao tom duro do comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), que arquivou expectativas de corte na Selic de 13,75% no curto prazo. Afinal, juro alto desestimula compra de ações.
Mas a intensidade foi acima das expectativas: o tombo chegou a passar de 3% durante o dia, e o Ibovespa fechou com queda de 2,46%, para 97.756 pontos, portanto com perda do patamar de 100 mil pontos. O dólar também subiu, de forma mais moderada: 1,01%, para R$ 5,29.
Além dos motivos pragmáticos - menos recursos para o mercado de capitais por mais tempo e queda de preços de matérias-primas por maior aperto nos Estados Unidos -, investidores e especuladores identificam risco no aumento da pressão sobre o Copom. E além da briga entre Planalto e BC, entrou no radar do mercado o impasse entre Câmara e Senado sobre a votação de medidas provisórias que está travando o trabalho legislativo, observa Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating:
— A reação ruim é resultado de todas essas questões juntas. A decisão do BC deveria ter sido positiva, por mostrar austeridade e independência efetiva, mas não foi isso que aconteceu. Em reação ao comunicado, os juros futuros estão subindo muito. Não acho que a Selic vá subir. No máximo em agosto, começa a queda. Teria condições de cair em maio, mas com essa quebra de braço com o governo, não sei.
Economista independente com muitos anos de mercado financeiro, André Perfeito havia previsto "caos" se o tom de confronto entre governo e BC se intensificasse, observou:
— Infelizmente, está se materializando o cenário desastroso.. Os bons modos monetaristas do BC não se traduziram em maior confiança dos investidores, o que faria os juros longos caírem com a maior vigilância (sobre a inflação), mas abriram a porta do medo que a dinâmica institucional entre Planalto e BC vá se deteriorar.
Na avaliação de Perfeito, no curto prazo o mal-estar poderia ser revertido se a ata do Copom, que será publicada na próxima terça-feira (28), sinalizar "maior coordenação com a Fazenda" ou se houver redução nos juros americanos de mercado (não na taxa básica). Mas ele mesmo não vê muita probabilidade em nenhum desses movimentos:
— A tragédia é que bastaria uma comunicação mais suave para atingir múltiplos objetivos. O mercado, a despeito da retórica fiscalista, no fundo torcia por um juro menor.
Na visão do economista, o BC tem motivos para manter a Selic inalterada, porque a inflação está elevada, e as expectativas não estão ancoradas, mas avalia que poderia ter "criado uma trajetória mais amena para o ajuste".
— Se o comunicado tivesse sido mais suave, o mercado hoje estaria em clima completamente diferente, e a bola estaria no colo da Fazenda, para apresentar um arcabouço fiscal crível. No meio dessa confusão, pergunto onde está o adulto responsável, porque só ouço apelos infantis de lado a lado — afirma o economista.