Para quem não acompanha no detalhe o universo bancário global, a aquisição do Credit Suisse pelo UBS - do segundo pelo maior banco suíço - é comparável à compra da Pepsi pela Coca-Cola. Ambos são espécies de símbolos desse mercado, estão entre os maiores do mundo e ajudaram a definir a atividade.
O negócio é tão inusitado que a quantia direta - US$ 3,2 bilhões - é considerada irrelevante, apesar de bilionária. E o que mostra o tamanho da encrenca e de sua potencial solução é a linha de liquidez garantida pelo Banco Nacional da Suíça (BNS, o BC do país) às duas instituições: 100 bilhões de francos suíços (R$ 565 bilhões pelo câmbio atual). Mas a pergunta que não quer calar é: vai resolver?
Para Lúcio Feijó Lopes, sócio-fundador do Feijó Lopes Advogados, que já intermediou negócios de US$ 10 bilhões em 15 anos de atividades, os bancos centrais de Suíça, Estados Unidos e União Europeia estão "muito empenhados" em dar estabilidade ao sistema financeiro global e acalmar os mercados. Entre outros motivos, avalia, porque "foi aprendida a lição de 2008".
Com experiência nesse mercado, Feijó Lopes detalha que os dois bancos suíços têm papel muito semelhante: assessoram famílias ricas a planejar seu patrimônio (na divisão chamada wealth management) e também auxiliam empresas não apenas a gerir melhor seus recursos mas também a abrir capital em bolsa, captar recursos no mercado global e até a fazer fusões e aquisições como acabaram eles mesmos protagonizando.
— A venda tem dois impactos: a redução de concorrência nessa área, porque sai um dos principais competidores, considerado muito inovador, e cria um novo gigante europeu, agora o UBS, que terá um total de ativos de US$ 5 trilhões — avalia Feijó Lopes.
Segundo o advogado, o que criou essa situação impensável há poucos meses foi a combinação dos sucessivos prejuízos do Credit Suisse - em todo 2021 e todo 2022 - com a tecnologia. Se antes filas na frente de agências davam o sinal do início da quebra de confiabilidade, hoje os saques ocorrem silenciosamente, sob a forma de transações eletrônicas.
Feijó Lopes também relatou à coluna que segue atuando na captação de recursos no Brasil, especialmente com CRAs e CRIs - Certificado de Recebíveis do Agronegócio e Imobiliários, respectivamente. Vê a negociação de debêntures "mais parada" depois do caso Americanas e diz que, de fato, o mercado está mais seletivo, mas não parado. Avalia que não se pode falar em "credit crunch" (queda brusca e aguda na disponibilidade de dinheiro para empréstimos) por aqui, mas que de fato é preciso monitorar esse risco:
— O sistema financeiro do Brasil é muito sólido. Tem uma negociação interbancária permanente que previne crises. Os bancos se emprestam entre eles de maneira que evita riscos de liquidez. Esse mercado também foi aprimorado depois da crise de 2008, fazendo com que agora a gente veja operações mais dinâmicas e digitais.
Curiosidade: até dezembro de 2021, o presidente do conselho de administração do Credit Suisse no Brasil era Ilan Goldfajn, que foi para o cargo depois de presidir o Banco Central (BC). Por indicação do governo anterior, hoje Goldfajn preside o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).