Dadas as surpresas embutidas na PEC da Transição, até que a reação do mercado financeiro ficou dentro do previsto. No final da manhã, a bolsa caía 2%, e o dólar subia 1,3%.
Na abertura dos negócios, o câmbio esteve mais nervoso e chegou a passar de R$ 5,50, mas depois desacelerou a velocidade de subida. A bolsa também chegou a mergulhar mais fundo e até o final da manhã moderou as perdas.
Além de a PEC alcançar um total de R$ 198 bilhões fora do teto de forma permanente, declarações do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, constaram dos comunicados de abertura de mercado. Na manhã desta quinta-feira (17) no Egito - madrugada no Brasil, Lula afirmou que "não adianta só ficar pensando em dado fiscal" e que o modelo atual "tenta desmontar tudo o que é da área social":
— Você tenta desmontar tudo aquilo que faz parte do social e não tira um centavo do sistema financeiro. Se eu falar isso, vai cair a bolsa, o dólar vai aumentar? Paciência. O dólar não aumenta e a bolsa não cai por conta das pessoas sérias, mas por conta dos especuladores que vivem especulando todo santo dia.
Como a coluna já detalhou, são esses "especuladores" que vão financiar o gasto fora do teto, por meio da compra dos títulos da dívida que o governo terá de lançar para obter esses recursos. Alguns são, de fato, especuladores. Mas também há fundos de previdência cujo objetivo é complementar a renda de aposentados que não querem depender só do sistema público.
Conforme Alex Agostini, economista=chefe da Austin Rating, a reação é a forma que o mercado tem para pressionar o governo sobre suas perspectivas de política econômica:
— O recado é de que, nessas condições, a situação vai ficar muito ruim, com juro e dólar disparando e bolsa despencando.
Valter Bianchi Filho, diretor da Fundamenta, destaca que o juro futuro para janeiro de 2024 bateu em 14,26%, retornando a patamares de 2016.
— Vamos começar a ver expectativas de inflação futura desancorarem, e o Banco Central voltar a falar em elevar o juro.
Bianchi tem uma curiosa tese sobre o claro - e insistente - desafio de Lula ao mercado:
— A visão dos mais esperançosos, entre os quais eu me incluo, é de que o novo governo está tentando uma barganha com o Congresso para colocar no orçamento algumas promessas de campanha. O Lula estaria desdenhando do mercado porque, até o final do ano, a conta é do Bolsonaro. Se o dólar for a R$ 6 e a bolsa, a 95 mil pontos, e, ao assumir, ele adotar postura responsável, com um bom nome na Fazenda, reverte esses indicadores e depois pode dizer 'fiz o dólar baixar e a bolsa subir'.