A regulamentação de operações com criptomoedas no país pode representar o início de uma nova era para as chamadas moedas digitais, um mercado com perspectiva de crescimento. Para o advogado, economista, presidente da Associação Brasileira de Direito e Economia (ABDE) e sócio do escritório Neubarth Trindade Advogados, Manoel Gustavo Neubarth Trindade, a aprovação, em abril, pelo Senado do projeto de lei que cria regras para essa atividade é um passo decisivo para o reconhecimento dos ativos virtuais. Além disso, afirma, o próprio Banco Central (BC) trabalha para lançar até 2023 o Real digital, sistema que permitirá, por exemplo, a realização de transferências de valores sem a necessidade da intermediação dos bancos.
– Os ativos virtuais no Brasil estão em franca expansão. Embora os termos normativos pudessem ser melhores, são avanços importantes que aumentam a segurança jurídica para o investidor no setor – explica.
O texto que volta para a Câmara é um substitutivo, que incorpora ideias anteriores sobre a temática e traz diretrizes para prestação de serviços de ativos virtuais e às empresas.
O Brasil está entre os cinco países do mundo com maior número de investidores em criptomoedas. Hoje, esse número é da ordem de 10 milhões de brasileiros, ou seja, aproximadamente 5% da população. Índia, Estados Unidos, Rússia e Nigéria são as outras nações com forte participação, segundo a Forbes Money. A parcela considerável de investidores envolvidos nesse mercado vem deixando clara para as autoridades reguladoras a necessidade da existência de legislação sobre o tema, algo que já vinha sendo discutido no parlamento brasileiro desde 2015.
Conforme o advogado, a tendência é a redução das taxas de juros, como ocorreu com o advento das Sociedades de Crédito Direito (SCD) e as Sociedades de Empréstimo entre Pessoas (SPE). Ambas são plataformas que ligam tomadores de crédito e concedentes. Tratam-se de fintechs, que reduzem custos de transação no sistema financeiro e aumentam a competição nos mercados, com maior eficiência econômica, diz Trindade.
Na mesma linha, outro avanço foi o PIX, hoje, consolidado. Atualmente, a cada R$ 5 em circulação, cerca de R$ 4 estão depositados nos cinco maiores bancos. O Real digital, somado à regulamentação dos criptoativos, segundo o advogado, deverá diminuir a concentração, democratizar o acesso e facilitar transações, já que não será necessária a intermediação dos bancos.
– Com o Real digital, o dinheiro poderá sair de uma wallet (carteira digital) para outra, sem a necessidade de uma instituição financeira intermediando. O PIX, por exemplo, foi uma grande revolução. Mas esse sistema ainda necessita de uma instituição bancária. Com criptoativos e o Real digital, isso não será mais necessário – explica.
A tendência, detalha Trindade, é que os bancos se adaptem. O Real digital, explica, também tende a facilitar e baratear a criação de contratos de empréstimos personalizados, para poucos dias ou com pagamentos em meses específicos. E, ainda, pode favorecer a integração com sistemas de pagamentos internacionais, permitindo que se faça uma compra em outro país com conversão imediata. Sem falar no potencial disruptivo dos contratos inteligentes (smart contracts), os quais se tornam muito mais viáveis com o surgimento de moedas digitais soberanas, menos voláteis e com maior segurança jurídica.
Diferentemente do Bitcoin e de outros criptoativos, o Real digital estará sob o controle do Banco Central. Na prática, será reconhecida oficialmente como moeda brasileira, isto é, o próprio Real, em versão digital. Dessa forma, o seu valor sempre estará atrelado ao mesmo do real convencional. Já as demais criptomoedas não são consideradas moedas soberanas, mas um ativo (que pode ser convertido para uma moeda convencional, seja dólar ou real), muitas vezes com valor instável e objetivos especulativos.