A coluna costuma acompanhar com atenção os levantamentos da indústria gaúcha, um setor importante para a economia do Estado. Nesta quarta-feira (6), um comunicado da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs) diagnosticou uma "crise inédita na história do setor". Como assim?
O problema central, conforme a entidade, é a imprevisibilidade. Essa condição é atribuída a um quadro formado por desorganização das cadeias de suprimento, escassez e alto custo de matérias-primas, inflação da pandemia somada à provocada pela guerra entre Rússia e Ucrânia, disparada do frete internacional, juro alto e câmbio "irregular".
A coluna perguntou ao presidente da Fiergs, Gilberto Porcello Petry se o fato de ser "inédita" quer dizer que a crise é a pior. Ele negou. Relatou que tomou a iniciativa de pedir o levantamento direto com as direções das empresas porque os relatos informais que recebia divergiam das médias colhidas nas estatísticas. A consulta foi feita com representantes de 30 atividades fabris.
— O resultado nos surpreendeu, por isso decidimos compartilhar. A gente ouve informações que chegam a assustar. Para trazer um contêiner do Exterior, que custava de US$ 1,5 mil a US$ 2 mil antes da pandemia, está entre US$ 12 mil e até US$ 20 mil com a guerra. Quem fabrica sob encomenda, como eu (a empresa de Petry, a Weco, produz máquinas e equipamentos para outras indústrias), vende agora para entregar depois e não sabe se o que gastou agora vai ser coberto pelo preço combinado — relata Petry.
No levantamento, apareceram 10 atividades com desempenho em queda, 10 estáveis e sete em alta. Outras três afirmaram que é "impossível comparar" anos tão atípicos. Petry destaca que surgiu até uma nova classificação: setores "travados", imobilizados por falta de insumos, por falta de mercado, ou por preferir não vender por não conseguir calcular margens seguras. Indústrias que fabricam por encomenda têm pedidos, mas não sabem se conseguirão ganhar algo quando entregarem produtos aos clientes, como no próprio caso do dirigente.
— Há uma desorganização total dos fornecedores, assim como a astronômica elevação de custos de transporte e contêineres. Isto retira qualquer chance de previsibilidade para as empresas — acentua Petry.
Outro dos elementos de inquietação na indústria gaúcha, confirma o presidente da Fiergs, é a queda do dólar. No ano passado, a disparada do câmbio foi um dos fatores que permitiu ao setor local, que tem parte de seus ganhos baseados em exportação, ter resultados melhores do que a média nacional. A queda neste ano, que já chega a quase 17%, tem efeito oposto, reconhece Petry:
— Empresas fizeram contratos de exportação com base no dólar a R$ 5,50, agora tem de entregar e receber R$ 4,60. Dá um susto. Tem empresa que já não sabe se está bom produzir e entregar, porque não está claro se vai ter lucro ou prejuízo.
Como o comunicado original da Fiergs menciona atenção para as negociações de contratos coletivos, ou seja, com os sindicatos para reajustes salariais, a coluna perguntou a Petry se um dos objetivos é dar um sinal amarelo nessa área. Ouviu essa resposta:
— Os contratos coletivos são feitos com base em um limite do INPC, durante a pandemia teve um ano sem negociação, porque o foco era manter empregos. Agora, existe percepção de que as coisas estão melhorando, mas não sabemos o que vai acontecer diante desses novos problemas. É nossa obrigação, como federação, informar aos sindicatos da indústria das dificuldades para não correr o risco der dar agora e não ter como pagar. Essa situação é a pior que tem, o empregado acha que foi enrolado.