Às vésperas do envio à Assembleia Legislativa do projeto do Palácio Piratini que define as regras de privatização da Corsan, o Ministério Público de Contas (MPC) do Estado decidiu entrar com representação no Tribunal de Contas do Estado (TCE) pedindo uma inspeção especial na estatal de água e saneamento.
Baseado em estudo já menci0nado pela coluna e rebatido pelo presidente da Corsan, Roberto Bartuti, mas com aprofundamentos acrescentados posteriormente, o MPC pretende provocar avaliação detalhada sobre a conveniência e os riscos da privatização, além da existência ou não de opções para financiar o investimento necessário.
A justificativa para a medida pouco usual é a verificação da principal alegação do Palácio Piratini de que a companhia não tem recursos suficientes para fazer os investimentos exigidos pelo Marco Legal do Saneamento (leia a representação completa, com 25 páginas clicando aqui).
Ricardo Hingel, ex-diretor do Banrisul e do banco BTG Pactual no Estado, foi o autor do estudo original, feito à luz da visão do mercado de capitais a pedido de ex-dirigentes da Corsan. À coluna, Hingel diz ver necessidade de abrir o capital da Corsan, mas não de privatizar a empresa, especialmente da maneira como o Piratini sinalizou em suas primeiras manifestações:
– O desenho preliminar do governo do Estado, a meu ver, não parava de pé. Avisei que não seria possível fazer em outubro (data inicialmente prevista para a capitalização), e isso se confirmou.
Na nova versão do estudo, detalha Hingel, está prevista uma abertura de capital, não com ações pulverizadas no mercado, como estava previsto nas primeiras manifestações do governo, mas com entrada de um "sócio estratégico e relevante". Para o ex-diretor de banco, esse é um passo essencial para garantir a melhoria da gestão da Corsan.
Para lembrar, a impossibilidade de a Corsan sustentar uma necessidade de investimento avaliada em R$ 10 bilhões até 2033 para cumprir as metas do Marco Legal de Saneamento foi a explicação dada pelo governador Eduardo Leite para mudar de ideia sobre a privatização da companhia. O Marco Legal prevê a necessidade de levar água potável e instalar tratamento de esgoto para ao menos 90% da população.
Conforme o MPC, seria necessário realizar "por meio de avaliação técnica consistente (...) as opções de alavancagem de recursos pela própria companhia, considerando as operações em andamento, e como a nova modelagem, que prevê a abertura de capital e venda de controle acionário, será imprescindível para a obtenção de recursos no valor aproximado de 10 bilhões de reais para o atendimento ao Marco Legal do Saneamento".
Caso o pedido de inspeção seja aceito pelo TCE e identifique "irregularidades prejudiciais ao interesse público", o MPC ainda pede que a privatização da Corsan seja suspensa por "decisão cautelar" até avaliação final sobre o tema.
Diferentemente da privatização da CEEE-D, que encontrou resistências mais pontuais, especialmente entre órgãos de representação dos funcionários e partidos de oposição, a capitalização da Corsan enfrenta críticas de integrantes de partidos da base de apoio do governo do Estado na Assembleia.
Os pontos para os quais o MPC pede atenção do Tribunal de Contas
1. Avaliação das vantagens da modelagem
2. Apuração da necessidade de investir R$ 10 bilhões até 2033
3. Avaliação dos riscos das operações
4. Apuração dos reais valores já captados pela Corsan
5. Avaliação do planejamento financeiro e tributário, considerando a imunidade tributária dada pelo STF
6. Exame dos contratos de auditoria independente e assessoria jurídica para a oferta pública
7. Exame do contrato de consultoria do plano de investimento
8. Exame dos contratos de serviços ligados a novos modelos com base no Marco Legal
9. Demonstração da capacidade econômico-financeira, conforme Marco Legal
10. Demonstração do impacto da venda do controle acionário na imunidade
11. Demonstração das razões da ausência de tomada de medidas suficientes para tornar a gestão mais eficiente
12. Verificação da necessidade da contratar rating (avaliação de risco de crédito) para a Corsan