No mesmo dia, dois indicadores deram aos brasileiros sinais aparentemente opostos: o IBGE anunciou o maior nível de desemprego da série da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Covid-19, iniciada em maio – e um dos maiores da história –, que significa 14 milhões de pessoas procurando trabalho sem encontrar.
Poucas horas depois, o Ministério da Economia apontou geração líquida de vagas (admissões menos demissões) de 414.556, a maior da série do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) iniciada em 1992. Os dois dados são de novembro.
É difícil de entender. Afinal, o Brasil tem desemprego recorde ou emprego recorde? A respostas simples seria "ambos", mas é preciso detalhar. Primeiro, o Caged, que tem explicação mais sucinta: o recorde do saldo entre 1.532.189 contratações e 1.117.633 demissões é reflexo da reação rápida, ainda que desigual, da economia brasileira, depois do fundo do poço. A demanda inesperada em vários setores exigiu mais mão de obra. O resultado foi esse salto em novembro.
Estendendo o olhar, o saldo acumulado de janeiro a novembro é de modestos 227.025 empregos com carteira assinada. No mesmo período do ano passado, foi de 948.344. O resultado consolidado em 11 meses deste 2020 é o pior nessa base desde 2016, auge da recessão, quando ocorreu fechamento líquido de 858.333 postos de trabalho formais. Sempre é bom lembrar que o Caged só registra contratações formais, com carteira assinada.
E aí começa a complexidade: a série histórica do desemprego medido pela Pnad Covid-19 é curta, tem apenas sete meses. Isso significa que o nível de desocupação é o mais alto, mas contando a partir de maio. A pesquisa acompanha indicadores relacionados ao impacto do coronavírus, além do mercado de trabalho (veja detalhes abaixo).
O indicador mais tradicional, a Pnad Contínua, já havia apontado recorde histórico em setembro, quando alcançou 14,6%, conforme o IBGE informou no final de novembro. Foi a maior taxa na série histórica iniciada em 2012, quando órgão ajustou sua metodologia para tentar refletir o desemprego "verdadeiro".
Mas só é considerado "desempregado", para efeito da Pnad Contínua, quem busca uma colocação no mercado de trabalho e não encontra. Economistas avaliam que, consideradas as pessoas que buscariam vaga se acreditassem no sucesso da empreitada, o número de desocupados no Brasil não seria de 14 milhões, mas ao redor de 20 milhões.
No mês anterior, outubro, um dado havia alarmado economistas especializados no mercado de trabalho: a Pnad Contínua apontou o menor número de empregados formais, ou seja, com carteira assinado, desde o início da série em 2012. Eram escassos 29,1 milhões. Essa pesquisa só será atualizada na próxima terça-feira (29). Até que esse dado não seja atualizado, o que se pode dizer é que o emprego está aumentando para a menor parcela do mercado de trabalho.
Entenda a diferença entre as pesquisas do mercado de trabalho
Cadastro Geral de Empregados e Desempregado (Caged): registra todas as admissões e demissões feitas por empresas dentro das normas da Consolidações das Leis do Trabalho (CLT), ou seja, com carteira assinada. Compara dados na mesma base desde 1992 em todo o país.
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua): criada em 2012 e atualizada em 2016, registra a quantidade de pessoas que estão ativamente procurando emprego, não apenas os que não têm colocação. É considerada a taxa de desemprego "oficial" do país, porque é pesquisada pelo IBGE, um instituto ligado ao governo federal.
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - Série Covid-19 (Pnad Covid-19): é considerada uma estatística experimental pelo IBGE para estimar o número de pessoas contagiadas por covid-19 e monitorar os impactos da pandemia no mercado de trabalho. Começou em 4 de maio de 2020, com entrevistas por telefone feitas em cerca de 48 mil domicílios por semana, somando 193 mil domicílios por mês, em todo o país. A amostra é diferente da usada na Pnad Contínua tradicional, por isso o IBGE não recomenda que seus dois levantamentos sejam comparados.